Andaluzia: eleição regional. Reflexo Nacional?

O PSOE entrou em colapso, cresceu a direita e irrompeu institucionalmente a ultradireita Vox. O resultado tem causado uma onda de sentimentos: decepção, pessimismo e ao mesmo tempo desencadeou importantes mobilizações. Foram levantados questionamentos: Será a perspectiva para a Espanha? O que se pode fazer para evitá-la?

O desencanto com o PSOE e o feito de que o Podemos não se transforme em uma alternativa senão em uma xerox do velho; pavimentando o caminha para a direita expressada pelo PP-Ciudadanos e a Vox. Onde colocam a cabeça, como no Brasil, na Europa e agora na Espanha, geral uma reação popular que demonstra que existe força para enfrentá-los. O problema não são as pessoas, senão a política dos dirigentes inconsequentes.

Não é um fenômeno irreversível. Para desbloqueá-los, tem que derrotá-los nas ruas e construir uma nova alternativa ampla, de esquerda, que não defraude seus seguidores e que sustentem um impulso sem meias medidas. A polarização social que recorre o mundo é o marco mais geral no que tem que analisar os processos sociais e políticos. As eleições andaluzas não escapam desta realidade.

O resultado

Sendo a região mais povoada do país (6,5 milhões de pessoas), o resultado se considera um indicador da intenção de voto para as eleições municipais de 2019 e para eventuais eleições gerais. Por isso, as forças do bipartidismo se jogaram tudo, como se fosse uma votação nacional.

Os resultados foram: PSOE-A: 27,9% – 33 parlamentares; PP:20,8% – 26 parlamentares; Cs: 18,3% – 21 parlamentares; Adelante Andalucía: 16,2% – 17 parlamentares e Vox: 11% – entrou com 12 parlamentares. Um quadro com o detalhe das eleições 2018/15 ilustra a magnitude das mudanças políticas. O PSOE afundou perdendo 14 vagas, o PP perdeu 7, Cs cresceu 12, Vox começou com 12 eleitos e Adelante Andalucía caiu de 20 para 17 vagas conquistadas. Outro dado importante é que houve uma escassa participação de 58,65%, quase quatro pontos a menos do que em 2015, um elemento que demonstra uma quota de decepção com os partidos e suas políticas de ajuste e corrupção. As pesquisas fizeram prognósticos que não contemplaram os dois fenômenos fundamentais: a magnitude da queda do PSOE e a votação do Vox.

As possíveis coalizões para conseguir a maioria absoluta de 55 poderiam ser: Vox, PP e Ciudadanos com 59 parlamentares; PSOE e Ciudadanos com 54; PSOE, Adelante Andalucía com 50 e PP, Ciudadanos 47. O concreto é que se as forças reacionárias façam um acordo poderiam ser maioria para governar. Tanto Juan Manuel Moreno como Juan Marín tem se postulado para a posto e estão dispostos a pactuar com Vox, que não quer ser uma pedra no caminho e deixar o poder para os “comunistas” do PSOE-A.

O bipartidismo abalado

O PSOE recebeu um míssil na linha de cômoda, já que Susana Díaz “La Sultana” se encontrava governando como continuidade do domínio socialista que durou 36 anos. Fez uma campanha com “cara abaixada”, aspirando capitalizar por sua gestão no governo. No final da campanha, se dedicou quase que exclusivamente a pedir o voto cutucando o fantasma do Vox.Também é um sinal claro para Pedro Sánchez e o PSOE em sua primeira disputa desde a moção de censura. As pesquisas diziam que estavam se recuperando nacionalmente, a eleição do domingo passado coloca um manto de dúvida a respeito e aprofunda a incógnita sobre a perspectiva.

Para o PP também foi uma prova por se tratar da primeira disputada após a queda de Mariano Rajoy. Com Pablo Casado como novo líder não sabiam como seria para eles a distribuição do voto da direita. O secretário geral dos populares se colocou na campanha apoiando Juan Manuel Moreno. Resultado, o PP seguiu caindo, ainda que pelo sistema eleitoral possa chegar ao poder. O bipartidismo PP-PSOE, eixo do Constituinte de ’78 está cada vez mais desprestigiado diante da população, esvaziado de conteúdo e afundado em corrupção.

Os que não aproveitam e os que aproveitam

Diante do retrocesso dos pilares do bipartidismo, faz tempo que vem se abrindo uma grande oportunidade para que o Podemos se transforme em uma alternativa que capitalize o vácuo deixado pelo velho. Lamentavelmente, essa possibilidade se esvai em cada cada disputa eleitoral. Adelante Andalucía (Podemos-A, Esquerda Unida, Os Verdes-CA, IA e PA), encabeçados pela Teresa Rodríguez, (Esquerda Anticapitalista) não manteve a soma de votos de seus dois principais integrantes e retrocedeu. O fato de que o Podemos nacional não seja uma alternativa e o deterioração da imagem de Pablo Iglesias tem um peso impossível de ignorar.

Seus eixos foram a crítica ao PSOE-A pelo facto com Ciudadanos na legislatura anterior, se apresentaram como “a única barreira frente à direita”, “alternativa ao PSOE”, com propostas de “transparência e mudanças favoráveis para as pessoas.”

A confluência dos elementos mencionados facilitou o crescimento do Ciudadanos. Inés Arrimadas (andaluza de nascimento) deixou a Catalunha e se mudou para Andalucía junto com Albert Rivera para apoiar seu candidato Juan Marín. Cs disputou com o PP a liderança do espaço da direita, e fez com três eixos políticos: “contra o independentismo catalão, contra a corrupção e por uma mudança” e se saíram muito bem, porque cresceram em votos.

E a ultradireita também se favoreceu, com uma forte erupção do Vox nas instituições, pela primeira vez, com Francisco Serrano como candidato e Santiago Abascal como dirigente máximo. Essa formação tem um programa, antifeminista, xenofobico e homofobico, que rejeita o atual regime de autonomias e fomenta uma lealdade nacionalista espanhola. Se apresentou sem estrutura local e apenas com propostas nacional.

Vale destacar que não é pouca a colaboração que os meios de comunicação massivos vem dando para a instalação do Cs e Vox no grande cenário da política nacional.

Opiniões para o debate

A queda do PSOE-A foi um inesperado balde de água fria que Sánchez não conseguiu se esquivar e empurra o adiantamento das eleições gerais. Os dois principais expoentes do bipartidismo seguem sofrendo importantes contratempos eleitorais que ao mesmo tempo aprofunda os problemas de um regime esgotado, que não pode dar respostas progressivas para a maioria dos trabalhadores e ao povo.

Ciudadanos reafirmou o dinamismo que já se havia manifestado quando Arrimadas foi a mais votada na Catalunha. De nenhuma maneira se pode ignorar o crescimento do Vox no marco de uma Europa onde os fascistas colocam a cabeça para fora.

Em meio de uma polarização política e social crescente, a perda de votos dos velhos partidos orientou seu pêndulo para a direita. Em outro momento tenha se movido para o extremo oposto quando o Podemos apareceu como emergente dos Indignados do 15-M.

O Podemos está desencantando milhões de pessoas que acreditaram numa mudança realmente progressiva e a fundo era possível. Com sua adaptação ao regime pelos cargos, sua aproximação ao PSOE que é parte do problema e não da solução e seus mecanismos internos cada vez mais burocráticos vai de crise em crise e não aparece como uma alternativa.

Existem alguns cínicos que avaliam o crescimento da direita e da ultradireita como uma resposta ao “Procés”. Induzem a responsabilidade pela aparição dos fascistas aos milhões de catalãs que votaram democraticamente pela autodeterminação no Referendo do 1-O, aos presos políticos e exilado, aos que não querem rei nem opressão. É uma verdadeira canalhice.

Se tivesse uma mínima honestidade política teriam que dizer que na Espanha está vigente o regime de 1978, com sua marca franquista que não impede os reacionários no desenvolvimento de sua política, senão que lhes permite e fomenta.

Também, muitos dos que se dizem “democráticos”, “progressistas” ou “republicanos” não apoiaram a autodeterminação, se colocaram “distantes” do 155 e do povo catalão. Mantêm um silêncio cúmplice diante da repressão, a existência de presos políticos, a perseguição, as acusações inventadas e as retiradas de liberdades democráticas. Esta falta de solidariedade ativa e mobilizada com a luta catalã é a que encoraja a direita e a ultradireita.

O desafio: construir uma nova alternativa política

Seria arriscado afirmar que a votação já marca a tônica geral para onde vão os votos do Estado espanhol, ainda mais em um país de realidades drasticamente mutáveis. Ao mesmo tempo seria um erro ficar de braços cruzados, esperando constatar se o cenário andaluz se repete ou não.

Se abre um grande desafio: tem que transformar a tristeza e preocupação pelo resultado em luta ativa e organizada para reverter ou bloquear a direita em todas suas expressões. Todavia o Vox não assumiu nenhum cargo e já começaram as mobilizações contra o partido. São um grande exemplo para seguir e demonstram que não há que baixar os braços.

O crescimento da direita não é irreversível nem é o fator dominante na situação mundial que é a polarização, expressada eleitoralmente em distintas conjunturas e com uma clara maioria contra os reacionários na mobilização.

Além de enfrentá-los nas ruas, têm que se impulsionar um reagrupamento de forças realmente democráticas e consequentes com isso, construindo uma nova alternativa política, anticapitalista, feminista, antirracista para o conjunto do Estado espanhol.

Que leve até o final um programa consequente para favorecer as grandes maiorias populares e não a um punhado de empresários, especuladores e corruptos amparados pelos governos locais e a União Européia. Construir a alternativa que se necessita é uma tarefa enorme, mas não impossível, é preciso começar a colocar os pilares para alcançá-lo. É uma das conclusões mais importantes a se retirar das eleições andaluzas.