O nascimento da Primeira Internacional

I Internacional

Em 1848, Marx e Engels concluíram a redação do Manifesto Comunista com um chamado: “Proletários de todos os países, uni-vos!”. Dezesseis anos depois, em 28 de setembro de 1864, esse chamado foi atendido pela fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), a Primeira Internacional.

Por Emilio Poliak

Durante o século XIX, o capitalismo se consolidou na Inglaterra e se espalhou por toda a Europa. Junto ao crescimento da grande indústria, a classe trabalhadora aumentou em número e organização. Demandas políticas também se somaram à luta pelas reivindicações sindicais, como o direito de voto dos trabalhadores defendido pelo Cartismo. Mas foi durante as revoluções de 1848 que o proletariado travou grandes batalhas e, embora derrotado, deixou lições importantes. Após um período de refluxo, iniciado com a grande crise econômica de 1857, o movimento operário reviveu e construiu novas organizações. Na Inglaterra, país com maior desenvolvimento capitalista, surgiu um novo sindicalismo jovem que daria origem ao Congresso dos Sindicatos, a primeira federação sindical.

O Internacionalismo Antes de 1864 existiram outras tentativas de organização internacional – a Sociedade dos Democratas Fraternais, a Liga Comunista e o Comitê Internacional – mas, é a partir do final da década de 1850 que, no renascimento das lutas, o sentimento internacionalista ganha peso na vanguarda dos trabalhadores. Por um lado, com as demandas pela redução da jornada de trabalho e aumentos salariais, a burguesia britânica respondeu com a contratação de trabalhadores franceses, belgas e alemães, o que foi alertando para a necessidade de travar uma batalha comum além de fronteiras nacionais. Por outro lado, o proletariado europeu acompanhou de perto e simpatizou com processos políticos como a guerra civil estadunidense (apoiando o Norte contra o Sul escravocrata) e a insurreição polonesa por sua independência. Foi neste contexto que, por ocasião da Exposição Mundial de 1862, trabalhadores ingleses e franceses estreitaram relações e em 28 de setembro de 1864, representantes da Inglaterra, França e outros países europeus realizaram uma reunião conjunta no Saint Martin’s Hall em Londres onde decidiram criar uma organização operária internacional.

O nascimento da AIT

Marx e Engels

Ali se resolveu criar um Conselho Geral para redigir os estatutos e convocar um congresso. Os Estatutos e o Manifesto Inaugural foram redigidos por Marx e expressaram o programa e os objetivos da nova organização. Inicia considerando que “a emancipação da classe trabalhadora deve ser obra dos próprios trabalhadores”, definindo a importância da independência de classe das correntes que ainda atuavam como o vagão da burguesia liberal. O Manifesto Inaugural, além da crítica ao sistema capitalista, levantou a necessidade do proletariado constituir o seu próprio partido independente da burguesia, bem como a luta pela revolução social e pela conquista do poder político. Era em essência o conteúdo do Manifesto Comunista de outra forma.

Debates internos

A Primeira Internacional reunia as principais correntes do movimento operário da época, já que o objetivo fundamental era constituir a unidade dos trabalhadores para enfrentar a burguesia em melhores condições. As principais correntes eram as TradeUnions inglesas, a base fundamental para a militância; os Proudonhians (seguidores de Pierre Joseph Proudhon); os Lasalleanos (seguidores de Ferdinand Lasalle); e os Marxistas, que vieram principalmente da velha Liga dos Comunistas. Diferentes concepções de caráter e objetivos foram expressas internamente, de modo que debates ideológicos atravessaram as fronteiras da AIT. As primeiras polêmicas foram contra os proudonianos, um dos setores com mais peso nos primeiros anos com um programa que defendia o mutualismo e o cooperativismo. Não se pretendia destruir o sistema capitalista, mas sim uma transformação evolutiva baseada no desenvolvimento das associações de trabalhadores. Rejeitou o movimento sindical, a luta de classes e a greve como método de luta, além da ação política do proletariado. Também houve lutas ideológicas com os Lasalleanos, sectários em relação aos sindicatos, não contendo em seu programa e, por fim, acabaram fazendo acordos com Otto Von Bismark [Chanceler alemão entre 1871-90]. No entanto, a polêmica mais importante foi com Mikhail Bakunin, que ingressou na Internacional em 1868. A batalha ideológica entre o marxismo e o anarquismo perpassou todos os debates da AIT até o fim.

O papel da Internacional

A atividade da Internacional foi muito importante para dar um programa à classe trabalhadora e sua ação militante. Fez parte da luta pela conquista dos direitos políticos na Inglaterra, promoveu a luta pela redução da jornada de trabalho e desenvolveu campanhas de apoio e solidariedade com greves em qualquer país onde estourassem. Interveio ativamente na Comuna de Paris [1871], contribuiu para o desenvolvimento da organização sindical, para a elevação do nível político dos trabalhadores e, acima de tudo, deixou a semente do internacionalismo na classe trabalhadora.


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Dissolução e legado

Depois da Comuna de Paris, veio um novo refluxo das lutas do proletariado e um boom da expansão capitalista. Nesse quadro, a Internacional enfraqueceu-se e a classe operária se retraiu para o interior de seus próprios países. Mas a dissolução em 1874 não significou o fim da experiência e da consciência internacional, pelo contrário, abriria um importante precedente que seria retomado anos depois. Daí o otimismo de Marx quando escreveu: “Vamos dar aos nossos camaradas trabalhadores na Europa algum tempo para fortalecer suas organizações nacionais e, logo, serão fortes o suficiente para quebrar as barreiras erguidas entre eles e os trabalhadores de outras partes do mundo”. O certo dessas palavras seria confirmada alguns anos depois. No final do mesmo século, o marxismo ganhou peso entre o proletariado, o que contribuiu para a formação de importantes partidos socialistas que foram a base para a fundação, em 1889, da Segunda Internacional.

O internacionalismo como uma necessidade presente

A social-democracia passou a fazer parte do regime burguês desde 1914. A Terceira Internacional fundada por Lenin e Trotsky foi tomada pelo stalinismo na década de 1920 para ser finalmente dissolvida por Stalin em 1943 como parte dos acordos pós-guerra com o imperialismo. Já as direções que encabeçaram as revoluções no pós-guerra, como o Castrismo ou o Maoísmo, nunca promoveram a construção de uma direção internacional. Atualmente, o trotskismo é a única corrente da classe trabalhadora que levanta o internacionalismo militante como uma necessidade imperativa da classe trabalhadora e dos povos explorados do mundo. A atual crise sistêmica, a existência de um mercado mundial e fortes instituições imperialistas como o FMI, o Banco Mundial, a OCDE e outros, reafirmam a necessidade de construir uma organização revolucionária da classe trabalhadora, não apenas para levar adiante a solidariedade de classe, mas para enfrentar a burguesia em todos os países e construir o Estado-Maior da revolução mundial. Desde a Liga Internacional Socialista – LIS, assumimos esse desafio e contribuímos com nossa força militante para essa tarefa.