Perú: 15 de enero. Crónica de otra jornada de lucha

Por Sofía Martínez – LIS Peru

Peru: 15 de janeiro. Crônica de mais um dia de luta
Os protestos no Peru continuam e em um evento sem precedentes as manifestações chegaram ao exclusivo distrito de Miraflores, em Lima. No sábado 14 de janeiro, o Parque Kennedy foi resguardado por militares armados devido ao chamado para uma concentração em homenagem aos 49 peruanos que morreram durante os protestos. A atividade reuniu vários artistas, ativistas e cidadãos que se juntaram para participar. Na entrada do parque, uma faixa foi colocada como oferenda com flores brancas, velas e os nomes dos caídos.

Desta forma, o objetivo era tornar visível a identidade dos peruanos mortos durante os protestos, pois a mídia não oferece espaço para que as famílias das vítimas denunciem suas mortes. A maioria deles eram camponeses, membros da comunidade, jovens e a lista angustiante inclui 7 adolescentes. Cidadãos que vivem na pobreza e pobreza extrema, trabalhadores humildes cujos rostos e histórias merecem ser transmitidos e lembrados. Jornalistas da imprensa alternativa começaram a publicar memoriais em redes sociais diante da indiferença da grande mídia.

Os feridos também necessitam de apoio, pois os serviços de saúde hospitalar nas regiões carecem de equipamentos, medicamentos e pessoal adequado. Um dos casos mais graves é o de Rosalino Flores Valverde, um jovem de Cuzco, 21 anos, que foi baleado 36 vezes no estômago, das quais apenas 9 foram extraídas. Ele está no Hospital Antonio Lorena, onde está lutando entre a vida e a morte.

Dina Boluarte apareceu em uma mensagem à nação para informar sua recusa em renunciar à Presidência e o endurecimento das medidas repressivas; em um cruel ato de deboche contra o povo peruano, a Presidência do Conselho de Ministros liderada por Alberto Otárola declarou o ano 2023 como o “Ano da unidade, da paz e do desenvolvimento”. O Departamento de Lima e a Província Constitucional de Callao, assim como algumas regiões onde os protestos continuam, foram declarados em “Emergência”.
Isto inflamou ainda mais a população, que continua a realizar várias ações de protesto em nível nacional. Em Lima, uma mobilização maciça deixou o Centro Histórico para se juntar ao protesto em Miraflores. Havia quase cinco mil manifestantes, que se deslocaram por várias ruas de Miraflores até chegar a Larcomar, um centro comercial emblemático. Na porta do Hotel Marriot um grupo de ativistas entoou cantos, ao redor da piscina desfraldaram a enorme bandeira peruana de luto, gritando alto sobre a responsabilidade de Dina Boluarte pelo assassinato dos compatriotas e exigindo sua demissão.

O fato do protesto ter alcançado Miraflores significou um marco na luta, pois aqui os manifestantes não foram recebidos com golpes e bombas, como a polícia costuma fazer. Deve-se notar também que a organização melhorou e os ativistas estão agora muito atentos a possíveis infiltrações por parte da polícia.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos apresentou seu relatório final em uma coletiva de imprensa, observando um clima de extrema polarização e forte estigmatização étnica e regional. As investigações sobre abusos policiais e militares continuarão. E enquanto a CIDH estava dando seu relatório, o governo continuou com as prisões arbitrárias de líderes regionais e estudantis no sul, acusando-os de terrorismo sem provas. Atualmente há 7 dirigentes que foram transferidos para Lima e estão sendo mantidos na Direção Contra o Terrorismo (DIRCOTE).

O governo foi rejeitado pelo povo e está passando por uma crise histórica de legitimidade, o Instituto de Estudos Peruanos (IEP) publicou hoje os resultados de uma pesquisa nacional na qual 88% dos peruanos desaprovam o Congresso e 71% desaprovam a administração de Dina Boluarte.
A Superintendência de Trânsito (SUTRAN) informa até o momento 33 bloqueios de estradas em províncias com 100 pontos de bloqueio. As mobilizações em Lima e nas regiões também continuaram. A nação Awajun e a ronda camponesa do Amazonas assumiram o controle do oleoduto do norte do Peru com o controle da válvula de abastecimento. Deve-se lembrar que a CUNARC La Libertad está começando a observar uma greve radical, portanto, o fechamento dos mercados será total.
Várias delegações de Puno, Apurímac, Cusco, Cajamarca, Moquegua, Tacna e Arequipa iniciaram sua viagem a Lima, e estima-se que deverão chegar na segunda-feira, 16 de janeiro. Em Lima, várias organizações estão circulando o chamado para uma greve cívica nacional e popular para a quinta-feira 19 de janeiro. Enquanto este artigo está sendo finalizado, os manifestantes estão mais uma vez protestando em Miraflores.
Por isso é extremamente importante continuar fortalecendo a organização popular para que os 4 Suyos cheguem em Lima e nas ruas, para que o governo Boluarte possa ser derrotado de uma vez por todas.
A demanda por justiça permeia todo o Peru, um grito que vem dos Andes e que os ventos levaram para despertar os povos da costa e da selva. Esta luta significa a unidade dos esquecidos, os invisíveis que a Constituição da ditadura reprime e assassina. Uma luta que despertou a solidariedade dos Aymara, Quechua, Chanca, povos amazônicos, comunidades afro-peruanas. Estamos fartos de tanta humilhação.
Nós, socialistas revolucionários, estamos mais uma vez colocando nossa alma nisso, da linha de frente, para contribuir para a vitória do povo.

Desde que alguém sofra
a rosa não pode ser bela;
Desde que alguém olhe para o pão com inveja,
o trigo não consegue dormir;
Desde que chova sobre o peito dos mendigos,
meu coração não vai sorrir.
Manuel Scorza: Poética