Sudão: Contrarrevolução e guerra de facções militares

Por Ezra Otieno

A contrarrevolução sudanesa estalou em combate aberto, o que tem provocado derramamento de sangue generalizado que já causou a morte de quase 100 pessoas e ferido mais centenas delas. Este conflito tão esperado sobre qual grupo de assassinos criminosos governará o Sudão, é o terrível resultado da incapacidade da Insurreição de 2018-2019 em levar o povo ao poder.

No sábado, 22 de abril, estouraram combates entre membros das Forças Armadas do Sudão (SAF), o exército regular do Estado, dirigidas pelo general Abdel Farrah al-burbank, o governante de fato da nação, e as Forças de Apoio Rápido (RSF), uma organização paramilitar firmada por impiedosos milicianos janjaweed que estão sob ordens do general Mohamed Hamdan Dagalo (mais conhecido como Hemedti).

Estes são os dois líderes chaves da contrarrevolução do Sudão. Desde a destituição revolucionária do general Omar al-Bashir em 2018, as RSF tem atuado como principal força de repressão, sufocando a explosão das massas de Jartum de 2019.

Burhan e Hemedti logo colaboraram em um golpe de Estado que deram contra o primeiro ministro civil, o liberal Abdalla Hamdok, em 2021, eliminando assim o governo títere de transição e reinstalando o controle militar direto. A sociedade com os liberais não era mais que uma tela para cobrir a autoridade dos generais contrarrevolucionários.

Desde o golpe, os generais tem competido pelo poder, colaborando com diversas potências imperialistas para fortalecer suas respectivas posições. Ambos tem participado em discussões de transição ao controle civil monitoradas por “Quad”(Estados Unidos, Reino Unido, Emirados Árabes e Arabia Saudita).

Estas negociações, que lamentavelmente incluem as Forças da Liberdade e Mudança (FFC), uma coalizão de Organizações supostamente proto democráticas criadas depois da insurreição, são uma fraude total. A população não tem ilusões que os generais renunciem ao poder, e qualquer “administração civil” formada com sua aprovação será uma (folha de papel) da tirania militar.

A recente redistribuição de pessoal das SAF e a construção de novas barreiras altas ao redor do quartel general do exército de Jartum, assim como o estabelecimento de pontos de controle e segurança adicionais e a inspeção de todos passageiros que chegam ao aeroporto, pressagiavam um conflito iminente.

A fagulha que desatou o conflito atual foi um cruzamento de declarações entre Burhan e Hemedti. Este último declarou que golpe de 2021 havia “fracassado” e (inacreditavelmente) condenou a Burhan por obstruir a transição à democracia. Isto da boca do homem que liderou as tropas que afogaram a insurreição de 2018-2019 em sangue. Burhan, por sua parte, queria estabelecer um Conselho Superior do Exército para depor a Hemedti como vice-presidente do Conselho Soberano governante.

As RSF afirmaram ter tomado posições chaves em Jartum no sábado 22, inclusive a residência presidencial, a residência do chefe do exército, a estação de televisão estatal e o aeroporto, assim como outros lugares em Omdurman, a região ocidental de Darfur e o aeroporto de Merowe no norte.

As SAF fizeram retaliações com tropas terrestres, ataques aéreos e artilharia, destruindo as posições das RSF, muitas das ruas estão localizadas em áreas metropolitanas ou próximas delas. Uma trégua temporária acordada no domingo 23 para transportar feridos se rompeu rapidamente. Burhan faz declarações contraditórias que pedem lá dissolução das RSF e também que seus membros se unam ao exército regular.

O ex porta voz das RSF emitiu um comunicado anunciado que foi perdida sua influência dentro da unidade mas que está acatando as instruções das SAF. O Comando de Inteligência das RSF também se uniu as filas das SAF, segundo as SAF.

No momento de escrever, determinar que bando controla que regiões é muito difícil. O certo é que o povo está ficando preso no fogo cruzado em todo o país.

Dada a intensidade de alguns combates, a recomendação das SAF de “permanecer dentro” fornece pouquíssima proteção.

Até o atual momento, existem registros de ataques aéreos em Jartum, Bahri, Burri, Riyad e Omdurman, enquanto aconteram escaramuças armadas em várias outras cidades, inclusive Karari, Port Sudan e El’Obeid. Também foi produzida violência significativa nas províncias ocidentais, de onde são recrutados a maioria dos milicianos das RSF, especialmente em Darfur, Kordofan e a região do Nilo Branco.

A população tem sido tomada de reféns dentro de suas casas, escolas e hospitais, usados como escudos humanos para tentar prevenir ataques. Há cortes de energia e água em Jartum, muita gente não tem alimentação nem remédios (durante o Ramadã, quando a maioria das pessoas já está jejuando durante as horas diurnas). Também tem havido denúncias de roubos residenciais e saques de comércios, principalmente por parte das RSF.

Os imperialistas, com certeza, tem derramado lágrimas de crocodilo pelo fracasso da “transição à democracia” do Sudão. Antony Blinken, secretário de estado dos EUA, instou por um cessar fogo urgente e a um regresso às “conversações que foram muito promissoras para por o Sudão no caminho de uma transição total até um governo dirigido por civis”.

Com certeza, nada parecido sairá das negociações de quarto dos fundos com os mesmos generais do exército que massacraram milhares de pessoas inocentes em seu ataque deliberado contra a insurreição em 2019 e desde então contra qualquer tipo de autoridade democrática.

O secretário de Relações Exteriores do Reino Unido, James Cleverly, reproduziu o mesmo absurdo, afirmando que “em última instância, o momento presente está nas mãos dos generais comprometidos com está luta”.

Depositar qualquer expectativa que Burhan e Hemedti tenham melhores intenções é um absurdo, refletindo um grande cinismo da parte dos imperialistas.

As nações ocidentais que participam na supostamente transição pacífica à administração civil não tem ocultado seus objetivos subjacentes: manter o forte controle sobre o Sudão, controlar o movimento revolucionário que começou em 2018 e limitar o impacto de seus competidores geopolíticos.

Uma coisa todos tem em comum é a necessidade de ” estabilidade”. Com certeza, a estabilidade de que falam se baseia em proteger o sistema capitalista e evitar que a luta revolucionária do povo desatar uma onda de insurgência em toda a região. Trabalham com bandidos como Burhan e Hemedti particularmente por este propósito.

O levantamento sudanês tem sido traído em cada etapa por seus líderes, que sempre vacilaram na hora de encarar uma confrontação militar decisiva entre as massas e a classe dominante. Em vez de, optarem por chegar a um acordo com capitalistas mafiosos.

As forças mais inescrupulosas, como as FFC, envolveu se em negociações diretas com a contrarrevolução, perdendo sua legitimidade ante as massas e pavimentando o caminho para a terrível derrota do movimento.

Uma vez mais, vemos a bancarrota do pacifismo da Coordenação de Comitês de Resistência. As classes dominantes muitas vezes indicaram a ameaça se guerra civil para justificar a sua falta de vontade para armar as massas para um enfrentamento final com os generais.

Como resultado, o povo tem sido vítima de um conflito unilateral nas mãos da contrarrevolução, que agora ameaça com afundar o Sudão em uma guerra civil entre camarilhas de carniceiros, ambas inimigas mortais dos trabalhadores e dos pobres.

A insurreição de 2018-2019 poderia ter aberto o caminho a transformação socialista da sociedade, o único caminho para que o povo possa viver uma vida Boa e Digna. Em tal contexto, qualquer partido revolucionário, por pequeno que seja, poderia ter jogado um papel importante nesses eventos. Infelizmente, tal partido não existe.

As massas estão pagando um preço terrível pelo fracasso de seus líderes. Apesar do extremo desgaste e desmoralização, o povo segue marchando e lutando até o dia de hoje.

Nada melhorará para as massas sudanesas por causa de quem ganhe está guerra interna de contra insurreição.

Tampouco pode haver expectativa alguma de que a “comunidade internacional” resolva está nova explosão de violência sangrenta, que os imperialistas só exacerbam. A única saída deste pesadelo é a revitalização da insurreição sudanesa, que deve aprender com os erros do passado, defender se de todas as forças reacionárias através de seus próprios organismos de luta e eliminar qualquer fator que a freie.

SAF Forças Armadas do Sudão.

RSF Forças de Apoio Rápido. FFC Forças da Liberdade e da Mudança.

Quad Estados Unidos, Reino Unido, Emirados Árabes e Arábia Saudita.