Caxemira: mobilizações massivas e o crescimento da esquerda revolucionária

Entrevista com Haris Qadeer, jornalista de Jamu e Caxemira, região ocupada pelo Paquistão, e membro da direção nacional da The Struggle (A Luta), seção da LIS no Paquistão.

Fale sobre o movimento atual que está sacudindo a região de Jamu e Caxemira

Talvez pela primeira vez na história, especialmente em Jamu e Caxemira, ocupada pelo Paquistão, tenha surgido um movimento de classe, e isso é muito importante. No passado, o movimento se concentrava na libertação de Jamu e Caxemira, ocupada pela Índia. Agora o foco mudou, há um grande movimento em Jamu e Caxemira, ocupada pelo Paquistão, e as pessoas se manifestaram especialmente para exigir o direito sobre seus recursos.

Haris Qadeer

Quando a Índia revogou o status especial da Caxemira em 5 de agosto de 2019, houve uma explosão massiva em Jamu e Caxemira, ocupada pelo Paquistão, para a libertação da região ocupada pela Índia. Mas esse movimento se desintegrou rapidamente e não conseguiu avançar. O movimento atual eclodiu em 9 de maio de 2023 contra os aumentos nos preços da farinha e no uso da eletricidade, e as pessoas estão se mobilizando desde então.

Nos últimos seis meses, as pessoas se recusaram a pagar suas contas de luz e realizaram repetidas mobilizações em massa em cada distrito, que prosseguem.

Como em muitos outros movimentos, há uma crise de direção. A maioria do Comitê de Ação Awami (do Povo) está nas mãos dos líderes pequeno-burgueses dos sindicatos de transporte e comércio e dos partidos nacionalistas de segunda linha. Essa é a razão pela qual não conseguiram entender a intensidade da demanda do movimento e não conseguiram negociar com o governo.

O movimento era tão forte que forçou o governo a abrir as portas para a negociação e quase o derrotou. Mas as negociações se arrastaram por três meses e as concessões oferecidas se mostraram insuficientes. No dia seguinte ao anúncio do acordo, em 4 de fevereiro, as pessoas rejeitaram as negociações e continuaram o movimento.

Essa situação encurralou não apenas o governo, mas também o Comitê de Ação Awami. As pessoas ainda não estão pagando suas contas, portanto, a pressão está aumentando sobre ambos.

Como a The Struggle está intervindo?

O papel da nossa organização foi fundamental nesse movimento, avançando nas exigências, na agenda de lutas e na formação do Comitê de Ação. Desempenhamos um papel decisivo no Comitê e um papel de direção em muitas localidades. Nosso companheiro no Comitê de Ação rejeitou o acordo firmado com o governo e apoiou a continuação dos protestos do movimento. Foi a nossa organização que confrontou o Comitê contra essas negociações. Esse foi um dos motivos pelos quais o Comitê foi forçado a voltar às bases e às negociações.

Obviamente, o movimento continuará, portanto, as pessoas terão de forjar uma nova direção para que o movimento siga em frente. Nossa organização, juntamente com outros aliados, está se certificando de exercer pressão suficiente sobre o Comitê para que ele não recue nas reivindicações e dê continuidade ao movimento.

As mulheres desempenham um papel fundamental no movimento…

Nossa organização teve muito a ver com isso. Foi por nossa iniciativa que o programa e a estratégia do Comitê de Ação incluíram um determinado dia em que mulheres e crianças marchariam. Como há muitos elementos de atraso cultural na região, houve muitos ataques a essa marcha e muitas tentativas, mesmo no Comitê, de sabotá-la. Mas, apesar desses ataques, nossas companheiras desempenharam um papel excepcional na defesa da iniciativa e lideraram as marchas das mulheres em todas as localidades, com exceção de uma.

O local mais crítico para as marchas das mulheres foi Rawalakot, onde a pressão do Estado, do clero e da ala direita era imensa. Eles tentaram intimidar as mulheres e fazer todo o possível para impedi-las de protestar nas ruas. Mas, apesar disso, mais de 700 mulheres se manifestaram naquele dia em Rawalakot.


Nosheen Kanwal, conselheira da Frente Revolucionária do Povo, liderando uma passeata massiva.

Fale-nos sobre a recém-fundada Frente Revolucionária do Povo (PRF) e as eleições que ela disputou.

Durante muito tempo, nosso trabalho foi estruturado na juventude, dirigindo a Federação Nacional de Estudantes de Jamu e Caxemira (JKNSF) desde 2006. Prevendo o surgimento de movimentos de massa, após um longo debate dentro da organização, decidimos lançar uma frente política com nossos camaradas e simpatizantes e fundamos a PRF em julho de 2022.

Ela está em um estágio inicial e não temos muita experiência em política de massas. As eleições municipais de 2023 foram as primeiras das quais participamos. Apresentamos candidatos em 27 alas. Uma de nossas candidatas, Nosheen Kanwal, conquistou sua cadeira no Conselho de Rawlakot, três outros candidatos ficaram em segundo lugar e, no total, obtivemos 35% dos votos nessas 27 alas.

Estamos muito ansiosos e animados com as possibilidades que se abrem para nós na construção de uma alternativa popular e dos trabalhadores em Jamu e Caxemira.