Por Sergio García

Há alguns dias, a Câmara Penal de CABA (Cidade de Buenos Aires, Argentina) revogou uma decisão anterior que buscava condenar nosso companheiro Alejandro Bodart, dirigente do MST na FIT-U e coordenador da LIS, por defender o povo palestino diante do genocídio perpetrado pelo Estado sionista de Israel.

A nova decisão da Câmara de Cassação e Apelações da Sala I dos Tribunais da Cidade absolveu Bodart, o que se transforma em mais um passo e triunfo democrático diante da manifesta intencionalidade política do sionismo e de todos os seus cúmplices de tentar calar as vozes que denunciam suas ações em Gaza e em todo o território histórico palestino. É a terceira vez, ao longo deste processo injusto, que conseguimos a absolvição.

Desde o início, ficou evidente que o objetivo da causa iniciada pela DAIA era estabelecer, por meio de uma condenação a Bodart, um novo precedente que depois lhes servisse como um manto de silêncio forçado sobre atuais ou futuros denunciantes das ações genocidas do governo sionista, para poder segui-las adiante sem nenhum tipo de obstáculo e evitar que a opinião pública soubesse a verdade do que acontece.
No entanto, desta vez foram derrotados, e isso é uma vitória de Alejandro, de seus advogados defensores María del Carmen Verdú e Ismael Jalil e é um triunfo coletivo de todas e todos que denunciamos o genocídio sionista, defendemos a causa palestina e seu direito inegociável de viver em seu território de forma livre e sem ocupantes, do rio ao mar.

María del Carmen Verdú, Alejandro Bodart e Ismael Jalil

É evidente que estamos em um momento em que, em todo o mundo, se levantam cada vez mais vozes contra o genocídio que o Estado de Israel leva adiante; desenvolvem-se enormes ações de solidariedade, mobilizações massivas, ações de trabalhadores e a emblemática Flotilha Sumud Global, que conquistou um apoio social de magnitude inédita. Todo esse contexto faz parte da decisão recente. E pode, no futuro, também pesar a favor em outros casos, como o de Vanina Biasi ou de outros denunciados pelo sionismo em diferentes países.

Caem os falsos argumentos do sionismo

A recente decisão não apenas absolve Bodart — o que já é muito importante por si só. Além disso, joga por terra muitas das falsidades que, ao longo do processo e das audiências, foram levantadas tanto pelos advogados da DAIA quanto pelo Ministério Público. Não vamos abordar aqui todos esses pontos relevantes aos quais a decisão faz referência, mas sim alguns exemplos.

Por exemplo, diante da falsidade da DAIA ao tentar usar como norma uma definição de antissemitismo conveniente a seus objetivos, exigindo que se julgasse segundo a definição da IHRA, que, segundo eles, deve ser aplicada em nosso país, a decisão afirma: “Surge tanto da página web da instituição como da resolução 114/2020 que aquela não é juridicamente vinculante. Assim, ainda que essas definições possam, e devam, ser utilizadas como pautas orientadoras, o certo é que o juiz deve resolver o caso conforme a normativa legal e convencional aplicável, as circunstâncias de fato e as provas produzidas no debate…”

Em relação ao argumento absolutamente falso da DAIA e de seus cúmplices midiáticos e judiciais de que antissemitismo e antissionismo são a mesma coisa, a decisão rejeita essa falácia e afirma: “Essa associação de conceitos realizada pela maioria da sentença impugnada não pode implicar em anular a distinção entre ambas as noções e a base de que se partiu, relativa a que está fora de controvérsia que a crítica e os questionamentos às ações realizadas pelo governo de Israel através de seus dirigentes políticos, como os representantes do governo, membros das forças armadas ou funcionários de sua política externa, é a materialização de um direito fundamental para as democracias: o exercício da liberdade de expressão e acesso à informação. Isso, na medida em que a posterior identificação dos conceitos Estado de Israel, comunidade judaica, povo israelita e sionismo, assim como a equiparação do antissionismo como “o antissemitismo moderno”, podem levar a que, na prática, nenhuma crítica seja permitida. Além disso, devemos destacar que, contra o afirmado pela acusação na denúncia inicial, não existem elementos normativos para sustentar que a posição antissionista esteja “prevista em lei como crime”.

E sobre o mesmo tema, em outro trecho a decisão acrescenta: “Enfatizamos que não é possível identificar os conceitos de Estado de Israel, ‘comunidade judaica’, ‘povo israelita’ e ‘sionista’, já que isso terminaria por anular a distinção entre conceitos que não são de modo algum equivalentes, pois as críticas e os questionamentos às ações realizadas pelo governo de Israel através de seus dirigentes políticos eram a materialização do direito à liberdade de expressão”.

A decisão absolutória também entra no debate sobre o genocídio que a DAIA tenta ocultar — sem sucesso — e sobre o que está acontecendo na região, e define: Quanto à qualificação do Estado de Israel como genocida por sua atuação em Gaza, cabe indicar, como bem mencionou o juiz que liderou o voto majoritário da sentença impugnada, que, em novembro de 2024, o Tribunal Penal Internacional emitiu ordens de prisão contra Benjamin Netanyahu — primeiro-ministro de Israel — e Yoav Gallant — ministro da Defesa de Israel — por crimes contra a humanidade e crimes de guerra cometidos desde pelo menos 8 de outubro de 2023 até pelo menos 20 de maio de 2024, dia em que a Procuradoria apresentou os pedidos de ordens de prisão… não podemos senão concluir que, ainda que Bodart tenha se expressado de forma categórica e com termos fortemente negativos, o certo é que não se pode afirmar que suas palavras tenham ido além de uma opinião crítica às políticas, em seu entender, expansionistas do Estado de Israel e do sionismo”.

Por outro lado, finalizando qualquer tentativa de culpabilizar Bodart, a decisão afirma que: “De sua simples leitura, não se pode sustentar que as declarações do acusado na mencionada rede social constituam incitação ou estímulo à perseguição ou ao ódio contra uma pessoa ou grupo de pessoas por sua raça, religião, nacionalidade ou ideias políticas. Isso porque não se depreende de suas postagens qualquer discurso de ódio, mas, ao contrário, uma opinião forte, contundente e com conotação política”.

A decisão, por fim, conclui defendendo o direito à liberdade de expressão de Bodart e voltando a diferenciar os conceitos de antissemitismo e antissionismo, quando afirma: Não é possível sustentar que as manifestações de Bodart na rede social ‘X’ tenham estado fora do direito à liberdade de expressão; tampouco se pode afirmar que impliquem uma crítica ou desqualificação ao povo judeu, ou aos habitantes de Israel, nem que, nessa medida, devam ser qualificadas como antissemitas. Ao mesmo tempo, essa conclusão também se apoia no fato de que os termos antissemitismo e antissionismo não são equiparáveis, e que o último é qualificado pela própria relatora especial sobre liberdade de expressão da ONU como ‘uma ideologia política”.

Mais do que nunca com a Palestina

Conseguida esta nova vitória política e judicial, agora temos que seguir adiante na defesa do povo palestino e, mais do que nunca, na denúncia ao genocídio que está sendo perpetrado em Gaza e às novas ocupações e agressões em outros territórios palestinos. Estamos diante de uma causa da humanidade e temos que redobrar nosso apoio e solidariedade.

E também temos que estar preparadas e preparados para seguir batalhando na justiça, na medida em que os defensores do genocídio tentem apelar e continuar com suas denúncias falsas e vergonhosas. Hoje estão, para esse objetivo, mais enfraquecidos do que antes. E por isso, apoiados no triunfo desta decisão absolutória, não vamos permitir que nos calem e vamos continuar denunciando todas as ações do Estado sionista de Israel. Viva a Palestina livre, do rio ao mar!