Introdução: Contexto internacional e a quarta onda feminista
A quarta onda feminista, que pode ser rastreada aos levantes globais de 2012–2013, surgiu da crise do neoliberalismo e como resposta às políticas misóginas. Longe de ser simplesmente uma forma de feminismo “digital” ou de “hashtag”, combinou a visibilidade online com massivas manifestações de rua e assembleias, tornando-se a expressão especificamente feminista de rebeliões populares mais amplas. Da América Latina à Europa e ao Oriente Médio, mulheres e pessoas LGBTQIA+ tomaram as ruas com demandas como o fim da violência de gênero, o direito ao aborto, a igualdade salarial e a liberdade de expressão de gênero. A Greve Internacional de Mulheres, o movimento Ni Una Menos e inúmeras mobilizações do 8 de Março em mais de 80 países mobilizaram milhões de pessoas e criaram novas formas organizativas, muitas vezes horizontais e assembleárias, que uniram diversas correntes feministas e setores sociais.
Essa quarta onda atingiu seu auge entre 2015 e 2020, inspirando uma juventude radicalizada aberta a ideias anticapitalistas e revolucionárias. No entanto, hoje o movimento enfrenta um retrocesso, não apenas devido à pandemia ou às vitórias parciais que conquistou, mas também ao avanço global de regimes autoritários e de extrema direita. As forças reacionárias fizeram do ataque às conquistas feministas e LGBTQIA+ um ponto central de sua agenda política. Nesse sentido, o retrocesso contra a quarta onda não é apenas cíclico, mas estrutural, parte da recomposição autoritária do capitalismo global. Portanto, defender as conquistas da quarta onda não pode ser separado da luta mais ampla contra o autoritarismo, a extrema direita e a própria ordem neoliberal. Um feminismo anticapitalista, revolucionário e internacionalista deve enfrentar essa ofensiva com a mesma criatividade, radicalidade e internacionalismo que marcaram o surgimento da quarta onda.
Ofensiva reacionária da extrema direita contra os direitos de gênero
A extrema direita avança com uma ofensiva global contra os direitos das mulheres e pessoas LGBTQIA+, como parte de uma agenda antisocial e antidemocrática mais ampla. Governos de extrema direita em todos os continentes estão ativamente desmontando direitos arduamente conquistados.
Um panorama da situação das mulheres e dissidências no mundo:
- América do Norte: Sob líderes como Donald Trump, as políticas buscam definir o gênero biologicamente, desmontar programas de prevenção ao HIV e promover um modelo de família tradicional que reforça a subordinação das mulheres. Os EUA não possuem leis específicas sobre feminicídio, ficando atrás de muitos países na documentação e no julgamento de assassinatos de gênero. Embora metade das mulheres assassinadas sejam vítimas de parceiros íntimos, a ausência de uma definição legal torna as estatísticas pouco confiáveis e subnotificadas. Em março de 2025, os EUA novamente se recusaram a ratificar a CEDAW, permanecendo como a única nação do G7 fora do tratado, o que está em consonância com os ataques contínuos aos direitos reprodutivos e LGBTQIA+. No centro dessa agenda está a direita cristã, enraizada no protestantismo evangélico branco. Embora originalmente mobilizada nos anos 1970 para defender escolas cristãs privadas segregadas racialmente, o movimento adotou o aborto como causa unificadora. Hoje, desempenha um papel central na legislação antigênero e anti-LGBTQIA+, tendo sido fundamental na revogação da decisão Roe vs. Wade, justificando suas posições com base na autoridade bíblica. Nesse contexto, a conservadora Heritage Foundation elaborou o nefasto “Projeto 2025”, que define quatro objetivos principais: restaurar a “família americana”; desmontar o Estado; defender as fronteiras nacionais; e assegurar o “direito divino” das pessoas. Ou seja, uma agenda ofensiva baseada em uma ideologia reacionária e antidireitos.
- América do Sul: No Brasil, Bolsonaro instalou uma agenda antidireitos, profundamente misógina e LGBTQIA+fóbica. Promoveu mudanças no sistema educacional e dificultou a aplicação da Lei de Aborto legal em quatro situações, entre outros ataques reacionários. Na Argentina, desde o início do governo Milei, há ataques sistemáticos aos direitos democráticos e de gênero, com o desmonte de políticas anteriormente conquistadas, ainda que com limitações. Desde seu discurso no Fórum de Davos no início de 2025, os ataques se intensificaram, mirando a comunidade LGBTQIA+ e ameaçando revogar a Lei de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVE), a categoria legal de feminicídio e até mesmo negando a existência da desigualdade de gênero. Em El Salvador, Bukele lidera uma ofensiva contra o que a extrema direita chama de “ideologia de gênero”, na mesma linha dos exemplos anteriores, atacando direitos conquistados. No entanto, grandes mobilizações antifascistas e antirracistas no continente têm imposto limites aos planos da extrema direita sul-americana.
- Europa: Figuras da extrema direita, como Giorgia Meloni na Itália e Marine Le Pen na França, tentam “feminizar” sua imagem pública, mas mantêm uma retórica xenófoba, racista e antimigratória, especialmente contra populações muçulmanas e africanas. Não há uma defesa real dos direitos das mulheres.
- África: Em 2024, a África teve a maior taxa de assassinatos relacionados a parceiros íntimos no mundo, mais que o dobro da taxa global. No Saara Ocidental, ocupado pelo Reino do Marrocos, a repressão atua com violência particular contra mulheres saarauís que lutam pela autodeterminação. Na África do Sul, uma mulher é assassinada a cada três horas. Em novembro de 2023, o Conselho de Pesquisa em Ciências Humanas (HSRC) da África do Sul publicou o primeiro estudo nacional sobre violência de gênero no país, concluindo que ela tem raízes em “normas e estruturas sociais profundamente enraizadas que perpetuam a dominação masculina e reforçam hierarquias de gênero… levando à subordinação feminina, desigualdades sistêmicas e violência contra mulheres”. No Quênia, o político Peter Kaluma lidera uma campanha para aprovar uma lei de proteção à família que proibiria relações entre pessoas do mesmo sexo, atividades queer e campanhas de defesa relacionadas. Em Uganda, o presidente Yoweri Museveni sancionou uma das leis anti-homossexualidade mais duras do mundo. Agora, ugandeses enfrentam prisão perpétua por relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo e pena de morte em casos de “homossexualidade agravada”. É importante destacar que grupos da extrema direita dos EUA e da Europa renovaram seu interesse na África, realizando conferências em todo o continente para promover a agenda de 2025 vinculada à reeleição de Trump. O casamento infantil ainda é defendido por normas arcaicas em todo o continente, com leis em países como Camarões, Nigéria, Senegal, Sudão do Sul, Sudão e Tanzânia permitindo sua prática.
- Oriente Médio: A agenda da extrema direita sionista é criar um Estado judeu autoritário e nacionalista fundado na lei judaica. As implicações dessas leis para mulheres palestinas que vivem em Israel (20% da população) são ainda mais graves. Em outros países da região vemos ataques semelhantes de governos e regimes “fundamentalistas religiosos”, com políticas hiperpatriarcais explícitas. Reformas legais no Iraque que permitem casamento infantil a partir dos 9 anos e dão mais poder aos tribunais islâmicos em questões familiares são exemplos claros dessa ofensiva. Em 2021, o Irã criminalizou o aborto, anticoncepcionais e esterilização voluntária. Em 2024, foi aprovada uma lei para impor o uso obrigatório do hijab, com multas, longas penas de prisão e restrições a trabalho e educação para mulheres e meninas que não cumprissem. (A lei foi suspensa após protestos públicos, mas não revogada.)
- Ásia: Segundo o Banco Mundial, mais da metade da população feminina mundial vive na Ásia-Pacífico. Em países como Indonésia e Malásia, a violência sexual é disseminada, o casamento infantil ainda é comum e as leis discriminam as mulheres, dando amplos poderes aos maridos. Muitas indonésias migram por falta de oportunidades e enfrentam exploração e violência, inclusive em destinos como Hong Kong. Em países como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Afeganistão, a homossexualidade é criminalizada e pode ser punida com prisão ou pena de morte. Nos Emirados, que aplicam interpretação conservadora da sharia, relações fora do casamento heterossexual também são crime e podem levar a prisão, multas, castração química, deportação e execução.
Um elemento central dessa ofensiva é o impulso ideológico para restaurar a imagem da família tradicional (ocidental) como único modelo social legítimo. Com isso, a extrema direita busca recolocar o trabalho reprodutivo na esfera privada, naturalizando a subordinação feminina e desresponsabilizando o coletivo e o Estado pelo cuidado. Essa manobra ideológica também alimenta a “guerra cultural” mais ampla, ou luta contra o chamado progressismo, que se tornou bandeira unificadora de forças autoritárias, nacionalistas e conservadoras em todas as regiões.
Essa ofensiva não é apenas uma reação aos avanços feministas, mas parte de uma recomposição estrutural do capitalismo global. Ela se adapta taticamente para ampliar apoio e seu crescimento entre homens jovens, frequentemente mobilizados por ideologias misóginas e xenófobas, exige vigilância ativa e resistência internacional coordenada.
Feminização da pobreza e violência
Segundo a ONU Mulheres (2023), a igualdade de gênero está a séculos de ser alcançada. Mulheres enfrentam desigualdade salarial e dedicam mais tempo ao trabalho reprodutivo, de cuidados e de criação de crianças.
. A violência de gênero segue alarmante, agravada por crises econômicas, climáticas e guerras, afetando desproporcionalmente mulheres e meninas, como evidenciado nos conflitos em Gaza, Ucrânia, Sudão e Etiópia.
Essas problemáticas mostram a interconexão entre opressão de gênero, capitalismo, patriarcado e crises globais, indicando que a luta por direitos não pode ser separada da luta contra a exploração econômica, a injustiça climática e a guerra.
Feminismo institucional, falsos progressismos e cooptação estatal
Nos últimos anos, o feminismo institucional cresceu sob governos “progressistas” que adotam discursos feministas sem mudanças estruturais reais. Essa institucionalização canaliza o movimento para marcos eleitorais ou simbólicos que não desafiam o capitalismo, separando a luta feminista da luta anticapitalista. Embora nesse período tenham sido alcançadas conquistas, estas não são duradouras ou integrais, reforçando a necessidade de lutar contra o capitalismo.
Exemplos como o do Chile mostram como essas estratégias diluem a mobilização radical, transformando-a em ações locais conciliatórias com o Estado. Esses “falsos progressismos” não melhoram substancialmente a vida das mulheres trabalhadoras, agravando a feminização da pobreza, a criminalização do aborto e as violações de direitos. As reformas costumam ser superficiais e subordinadas à lógica capitalista e às políticas de austeridade.
Na Argentina, durante o período kirchnerista, houve avanços como a legalização do aborto, e a confiança nesses governos gerou mobilização e sensação de que todos os objetivos haviam sido alcançados. Posteriormente, a dificuldade de garantir acesso ao aborto sem entraves e a chegada de Milei ao governo demonstraram que qualquer conquista é efêmera no marco do sistema capitalista.
A necessidade de uma saída revolucionária
Nenhuma conquista será possível sem luta de classes. É fundamental que a classe trabalhadora assuma o programa feminista como parte de sua estratégia de emancipação da humanidade, integrando-o a todas as lutas e reivindicações que a atravessam. Só assim construiremos uma força verdadeiramente revolucionária, feminista e dissidente.
Além disso, diante da “direitização” dos feminismos reformistas e dos fracassos de governos pseudo-progressistas, mulheres e dissidências precisam construir uma saída revolucionária junto com seus companheiros trabalhadores.
O feminismo anticapitalista enfatiza a importância da mobilização e organização amplas, pois o capitalismo perpetua a desigualdade de gênero para maximizar lucros e controlar socialmente. Por isso, uma luta feminista que não desafie o capitalismo será sempre parcial e temporária.
I. Origem do patriarcado: A fundação da dominação masculina
A origem do patriarcado deve ser buscada nas transformações materiais das primeiras sociedades agrícolas. Com o surgimento da agricultura sedentária e da propriedade privada da terra, apareceram novas hierarquias: o controle dos recursos econômicos tornou-se fundamental, e quem possuía a propriedade podia também controlar a reprodução e a vida familiar. O patriarcado, portanto, não nasce como um “instinto natural” nem como uma vontade divina, mas como uma estrutura social funcional à gestão da propriedade e à reprodução da força de trabalho. Os homens, proprietários da terra e do poder político, controlavam a descendência e o trabalho reprodutivo das mulheres, integrando assim o domínio de gênero na lógica econômica e social da comunidade.
O patriarcado, entendido como “governo dos pais”, é uma forma de organização social em que a autoridade reside no homem chefe da família, estendendo-se além do âmbito doméstico para estruturar a sociedade e legitimar o domínio masculino sobre mulheres e crianças (Gerda Lerner). Sua existência remonta a milênios antes do capitalismo.
Embora mulheres tivessem maior autonomia em sociedades primitivas, a transição para a organização patriarcal está ligada ao surgimento da propriedade privada e da acumulação de riqueza. Marx e Engels apontaram que a família patrilinear consolidou a opressão feminina para garantir acumulação e herança sob controle masculino. O Estado moderno, por meio de leis e estruturas econômicas, perpetua essa subjugação, reforçada por instituições como a heterossexualidade compulsória (María Milagros Rivera Garretas), fundamental para controlar a reprodução e a sexualidade das mulheres.
II. Origem do capitalismo e sua relação com o patriarcado
O capitalismo, como modo de produção mais recente, encontrou no patriarcado uma estrutura funcional para intensificar a acumulação e a exploração. O patriarcado possui grande poder de adaptação e reestruturação. Não inventou a dominação de gênero, mas a aprofundou e reconfigurou.
- Família: Instituição-chave na reprodução das hierarquias de gênero e da força de trabalho. Relega mulheres ao trabalho doméstico, reprodutivo e de cuidados — não remunerado — que subsidia o sistema capitalista. A família também funciona como unidade de consumo e rede de segurança social em tempos de crise, sobrecarregando especialmente mulheres trabalhadoras, enquanto para a classe capitalista garante a transferência de riqueza e a reprodução ideológica, ao invés da redistribuição social de recursos.
- Divisão sexual do trabalho: O capitalismo mantém a divisão sexual do trabalho, base material central dos papéis de gênero e, consequentemente, da opressão de mulheres e pessoas LGBTQIA+. Mulheres são sistematicamente empurradas para trabalhos de cuidado não remunerados ou mal pagos, muitas vezes confinadas ao espaço privado, e canalizadas para empregos precários. Isso não ocorre porque mulheres são “naturalmente” melhores cuidadoras, mas porque o capitalismo exige que a reprodução da força de trabalho seja privatizada e recaia desproporcionalmente sobre elas. Reforçando esses papéis, o sistema mantém desigualdades salariais, insegurança no emprego e a ideologia sobre o lugar “natural” da mulher no lar. Quem desafia normas de gênero binárias ou papéis prescritos, como pessoas LGBTQIA+, enfrenta maior repressão social, econômica e política.
- Controle sobre o corpo e sexualidade: A mercantilização do corpo feminino, padrões de beleza, idealização da família nuclear heterossexual e restrições aos direitos reprodutivos reforçam o controle patriarcal e a lógica capitalista.
- Violência estrutural: A violência contra mulheres é multidimensional (doméstica, laboral e estatal) e sustenta ambos os sistemas ao mantê-las em situação de vulnerabilidade.
- Instituições: O Estado, o sistema jurídico, a polícia e instituições religiosas reproduzem desigualdades e perpetuam violência estrutural por meio da inação ou cumplicidade.
III. Imperialismo e opressão das mulheres
O imperialismo não é um aspecto acessório da guinada à direita; é a base que molda o mundo atual. Ele define o quadro de exploração, pilhagem e dominação em que a opressão das mulheres se reproduz. Para entender o momento atual, é preciso reconhecer que o imperialismo é inseparável do capitalismo: é sua fase mais avançada e o terreno da luta de classes em escala global.
Essa perspectiva explica por que somos feministas revolucionárias: A opressão de gênero pode ser compreendida em suas formas atuais apenas analisando-a através das lentes do imperialismo e da luta de classes; no entanto, para entender suas origens e sua continuidade histórica, é preciso remontar aos distintos modos de produção – asiático, escravista, feudal e capitalista – e às relações materiais específicas que, em cada um deles, determinaram as hierarquias de gênero.” E também explica por que somos internacionalistas: dado que o imperialismo tem um caráter global, nossa luta pela libertação de gênero também deve ser global.
Da Ucrânia à Palestina, do Curdistão ao Saara Ocidental, mulheres estão na linha de frente da resistência a guerras e ocupações imperialistas. O patriarcado segue como coluna vertebral do capitalismo, mas nessa etapa a busca pela hegemonia imperialista intensifica a exploração e a violência, com consequências ainda mais graves para mulheres, migrantes e povos oprimidos.
Por isso, a libertação feminista deve ser tanto anticapitalista quanto anti-imperialista. Falsas esperanças de libertação por meio de atores imperialistas, como o papel da União Europeia na Ucrânia, apenas reforçam a dominação e enfraquecem as lutas por emancipação genuína. Nossa tarefa é travar a batalha ideológica contra essas narrativas e enraizar o movimento de mulheres em uma luta firme contra imperialismo, capitalismo e patriarcado.
IV. Feminismo revolucionário, anticapitalista e internacionalista: Rumo a uma emancipação integral
A inseparabilidade entre patriarcado e capitalismo implica que ambos devem ser desmontados em conjunto. Essa dupla opressão também afeta a comunidade LGBTQIA+ e exige um feminismo que vá além da igualdade formal e promova uma transformação social profunda.
- Visão holística: A opressão é interseccional e indivisível; abordar apenas gênero ou economia não é suficiente.
- Fundamentos materiais: O trabalho doméstico e de cuidados, não remunerado e invisível, é um pilar fundamental do capitalismo e deve ser reconhecido e socializado.
- Crítica à igualdade formal: A igualdade legal não elimina a opressão sem mudanças estruturais reais.
- Luta de classes: A libertação das mulheres e da comunidade LGBTQIA+ é inseparável da emancipação de toda a classe trabalhadora.
- Transformação radical: É necessária uma luta conjunta para transformar as relações econômicas e sociais, socializar o trabalho reprodutivo e desafiar a propriedade privada.
- Luta integral: A interconexão entre violência de gênero, precariedade laboral, desigualdade salarial e direitos reprodutivos exige uma resposta feminista integral e inclusiva.
- Perspectiva socialista: A erradicação definitiva da opressão sexista requer a construção de uma sociedade socialista diferente, acompanhada de uma ampla luta cultural e educativa. O feminismo anticapitalista propõe um programa que combina reivindicações imediatas com uma perspectiva revolucionária, lembrando que “nenhuma teoria é válida sem ação”.
Opressão e exploração: engrenagens do capitalismo patriarcal
A falsa promessa da igualdade formal
Para compreender a opressão de gênero sob o capitalismo, precisamos de um marco feminista marxista e materialista histórico que considere o gênero como uma relação social historicamente construída, enraizada na reprodução da sociedade de classes. A divisão binária de gênero e a hierarquia sexual não são verdades eternas, mas mecanismos para organizar e disciplinar a força de trabalho, defender a família nuclear heteronormativa e garantir a reprodução não remunerada da força de trabalho.
O trabalho de reprodução, de cuidados e de criação de filhos — feminizado e desvalorizado — é indispensável para o capital. Os papéis de gênero atribuem responsabilidades reprodutivas, naturalizam hierarquias e estruturam a divisão sexual do trabalho. O patriarcado não é um sistema separado: é parte constitutiva do capitalismo.
A opressão LGBTQIA+ segue a mesma lógica. A heteronormatividade é institucionalizada por meio da família burguesa, que reproduz a força de trabalho e as normas sociais. A criminalização e patologização de pessoas queer, trans e intersexo responde a objetivos de controle social e laboral. A violência contra pessoas trans, as cirurgias forçadas em pessoas intersexo e a exclusão do mercado de trabalho são expressões estruturais dessa ordem.
A igualdade jurídica conquistada em alguns países não elimina a opressão material. As mulheres se incorporam ao mercado de trabalho em condições precárias e enfrentam a carga da dupla jornada. Em 2023, a participação feminina na força de trabalho mundial foi de 48% (em comparação com 70% dos homens), com altíssimos níveis de informalidade, especialmente na África e na América Latina. A chamada “inatividade” das mulheres está marcada pelo peso do cuidado e pela desigualdade no acesso a serviços, educação e emprego.
As crises aprofundam essa realidade: a pandemia deixou muitas mulheres sem emprego e multiplicou a violência doméstica; em desastres e conflitos, a violência sexual e o tráfico de pessoas aumentam drasticamente. As respostas estatais negligenciam em grande parte as necessidades das mulheres e dissidências de gênero, e vemos como os direitos LGBTQIA+ podem ser facilmente revertidos.
Opressão, exploração e violência
O capitalismo combina a exploração laboral com a opressão estrutural. Como exploração e opressão estão inter-relacionadas, não podem ser separadas em lutas “primárias” e “secundárias”. Não pode haver verdadeira libertação sem abolir a base material da exploração, mas a luta contra a opressão não é um assunto secundário: ela começa aqui e agora. O capitalismo funde a exploração do trabalho com formas estruturais de opressão, e superar a exploração só é possível se também desmontarmos as divisões e fragmentações criadas pela opressão dentro da classe trabalhadora.
Mulheres, comunidade LGBTQIA+ e pessoas migrantes estão sobrerrepresentadas em empregos precários, informais e mal remunerados. O trabalho reprodutivo e de criação de filhos não remunerado sustenta a acumulação capitalista. A austeridade e a privatização corroem direitos, enquanto persistem o assédio no trabalho, as desigualdades salariais e a repressão à organização sindical.
A violência patriarcal — feminicídios, agressões sexuais e violência estatal — tem raízes na desumanização de mulheres e pessoas LGBTQIA+, reduzidas a objetos de dominação masculina. Ao mesmo tempo, a opressão serve ao ordenamento capitalista. Ela nega acesso a saúde, moradia e autonomia reprodutiva, e se intensifica durante crises, guerras e desastres. O Estado e suas instituições reproduzem essa violência como forma de controle social.
Crise climática, guerras e migração
A destruição ambiental capitalista afeta desproporcionalmente mulheres e comunidades marginalizadas, que frequentemente são responsáveis pela produção de alimentos, pelo trabalho de reprodução, de cuidados e de criação de filhos. As guerras imperialistas geram deslocamentos em massa, violência sexual e militarização patriarcal. De Gaza ao Sudão, o militarismo se beneficia do derramamento de sangue e normaliza a violência de gênero.
A migração forçada por guerra, crise climática ou espoliação econômica coloca as mulheres migrantes na intersecção entre exploração laboral e violência de gênero. O capital se beneficia de sua mão de obra barata enquanto fomenta a xenofobia para dividir a classe trabalhadora. Os fluxos migratórios atuais têm raízes em histórias coloniais e políticas imperialistas.
Racismo e colonialismo
O capitalismo foi construído sobre racismo e colonialismo, que continuam estruturando a divisão global do trabalho e a segregação social. O racismo de gênero se manifesta por meio de formas específicas de violência, negligência médica e exclusão econômica, afetando especialmente mulheres negras, indígenas e racializadas, incluindo pessoas queer e trans. O colonialismo contemporâneo se perpetua através da dívida, da ocupação militar e da pilhagem de recursos. Mulheres em territórios colonizados enfrentam hiperexploração, devastação ecológica e militarização.
A extrema direita tem reinterpretado o discurso racista sob uma aparência “feminista” para justificar políticas islamofóbicas e anti-imigrantes, como a proibição do uso voluntário do véu.
A comunidade LGBTQIA+ hoje
Em um contexto de polarização e do crescimento da extrema direita, o movimento LGBTQIA+ enfrenta uma ofensiva reacionária que busca reverter as conquistas obtidas em períodos progressistas anteriores. Essa reação se apoia em um discurso de ódio centrado em atacar a “consciência social”, utilizando argumentos biologizantes e religiosos, assim como narrativas individualistas que justificam o desmonte de políticas sociais. No entanto, esses direitos foram conquistados através da luta coletiva, não por méritos individuais nem pelo livre mercado. As medidas da extrema direita aprofundam a polarização e exigem do movimento unidade de ação e uma política revolucionária que confronte as lideranças conciliadoras, cujos fracassos abriram caminho para os ataques atuais. Diante da hipocrisia sionista do Estado de Israel, que utiliza o “pinkwashing” (uma estratégia de propaganda do governo israelense que explora cinicamente os direitos LGBTQIA+ para projetar uma imagem progressista, enquanto oculta a ocupação israelense e as políticas de apartheid que oprimem o povo palestino), devemos impulsionar firmemente, dentro do movimento LGBTQIA+, uma política antissionista e anti-imperialista. Nenhum povo pode lutar pelas liberdades democráticas que o movimento LGBTQIA+ exige sem antes se livrar da besta sionista.
Ao mesmo tempo, denunciamos a cumplicidade das burguesias árabes que abandonam o povo palestino e submetem suas próprias populações a renovadas opressões fundamentalistas para manter regimes autoritários inimigos dos trabalhadores, das mulheres e das pessoas LGBTQIA+.
Na África, nos países do Sahel que atualmente vivenciam um renovado impulso anti-imperialista, nos fortalecemos no ódio compartilhado às relações coloniais para exigir o protagonismo da classe trabalhadora e de suas próprias organizações, contra a concentração bonapartista do poder em certos líderes. As mulheres e as pessoas LGBTQIA+ não adiarão suas demandas: exigimos a erradicação de toda a antiga sociedade colonial e suas estruturas de opressão de gênero e étnica. Queremos ser protagonistas de nossa própria libertação.
Em países governados por líderes autoritários que se proclamam esquerdistas ou anti-imperialistas, nossa intervenção nos movimentos de mulheres e LGBTQIA+ é essencial para combater a repressão a toda expressão autônoma por parte desses regimes e para evitar que o ativismo caia sob a influência de correntes pró-imperialistas.
Marxismo revolucionário, feminismo e a luta contra a opressão de gênero
Os marxistas revolucionários devemos nos posicionar categoricamente contra todas as formas de opressão de gênero e sexual, defendendo o direito à autodeterminação das mulheres e das pessoas LGBTQIA+. É fundamental confrontar tanto os setores reacionários e religiosos que reduzem as mulheres a meros instrumentos reprodutivos quanto os setores “progressistas” que esvaziam de conteúdo as lutas pelos direitos civis, separando-as da luta de classes e de uma perspectiva verdadeiramente transformadora.
Devemos combater as políticas reformistas que redirecionam as lutas para marcos institucionais sem questionar a ordem estabelecida, assim como as correntes que enfraquecem a unidade da classe trabalhadora. Como revolucionários, apoiamos as lutas por reformas que melhorem as condições de vida da classe trabalhadora e das pessoas oprimidas. No entanto, temos igualmente claro que reformas, por si só, não podem abolir a exploração nem a opressão. Por isso insistimos em vincular cada luta parcial à luta mais ampla contra o sistema capitalista. E combatemos o feminismo radical, que centra nos homens o principal inimigo; as políticas de identidade, que fragmentam o movimento ao colocar a diferença acima da ação coletiva; o feminismo autônomo, que marginaliza o papel estratégico do movimento operário na transformação social; e o feminismo burguês, que promove o avanço individual dentro do sistema capitalista, a lógica da “chefe feminina”, mantendo intactas as estruturas de exploração e opressão.
Diante do avanço global das forças reacionárias, as respostas das massas não tardarão a chegar. Mas o verdadeiro impacto dessas mobilizações dependerá do nível de organização e da clareza política construída pela vanguarda em processo de radicalização. Nesse contexto, os e as revolucionárias têm uma tarefa urgente: construir uma força capaz de mobilizar milhares de ativistas, jovens e setores operários com vontade de luta, comprometida com um projeto revolucionário para intervir nas futuras batalhas de classe e abrir caminho para uma ferramenta política da classe trabalhadora que erga a bandeira do socialismo.
Sabemos que, sob o capitalismo patriarcal, os direitos conquistados por mulheres e dissidências sexuais sempre serão parciais e vulneráveis. A única solução definitiva é a transformação profunda desta sociedade. Como afirmou Trotsky, a verdadeira emancipação das mulheres só será possível com uma elevação geral do nível de vida e da cultura, e com a socialização do trabalho doméstico e de cuidados, que hoje recai principalmente sobre elas.
A luta contra a opressão de gênero não pode se reduzir à representação nem à igualdade jurídica: deve abordar as bases materiais da exploração, como a feminização da pobreza, a mercantilização do cuidado e a desigualdade salarial, reconhecendo que a raça, a migração, a idade ou a deficiência mediam a sobreexploração, especialmente no Sul Global. A luta contra o patriarcado exige a destruição do sistema capitalista.
Princípios e métodos estratégicos:
● Materialismo Histórico: Analisar o gênero como uma relação social vinculada à organização da reprodução e da produção capitalistas e também aos fundamentos estruturais das distintas formas de opressão e discriminação nas sociedades de classes.
● Reprodução Social: Coletivizar e socializar o cuidado infantil, o cuidado de pessoas idosas e as tarefas domésticas. Em todos os âmbitos da sociedade, não apenas no âmbito privado da família!
● Libertação LGBTQIA+: A autodeterminação de gênero é inegociável e faz parte da luta de classes.
● Abolição da Família Patriarcal: Promover formas coletivas de cuidado e vida comunitária.
● Trabalho em Setores Feminizados: Organizar trabalhadoras domésticas, trabalhadoras da confecção, cuidadoras, professoras e enfermeiras.
● Internacionalismo Feminista Revolucionário: A opressão das mulheres, a discriminação LGBTQIA+, o racismo e outras formas de opressão estrutural existem em todo o mundo devido ao sistema imperialista em que vivemos. Portanto, nossa luta deve ser internacional. O internacionalismo é a base de nossa análise e o alicerce que conecta nossas lutas transfronteiriças. Mas essas lutas só terão sucesso se forem guiadas por um programa socialista revolucionário que aspire abolir a exploração e a opressão em escala global.
Progressismo e Feminismo Burguês
Muitos progressistas promovem uma agenda que fragmenta as lutas sociais e transforma as demandas legítimas das mulheres e das pessoas LGBTQIA+ em reformas superficiais que não afetam a estrutura capitalista. Por exemplo, permitir o casamento igualitário, mas restringir a adoção, ou legalizar o aborto sem garantir o acesso efetivo, são exemplos de concessões formais que mantêm intactas as hierarquias sociais. Esses setores são dominados por um feminismo burguês que promove a “igualdade de oportunidades” limitada à mobilidade ascendente dentro do sistema, sem questioná-lo.
Demarcação entre Reformistas e Reducionistas
Os reformistas canalizam as lutas para vias institucionais que diluem seu conteúdo radical e desviam a energia dos movimentos de massas de seu verdadeiro objetivo: a transformação revolucionária. Ao mesmo tempo, devemos confrontar as posturas reducionistas dentro do próprio campo revolucionário, como as sustentadas pelas correntes stalinistas, que subordinam a luta das mulheres e da comunidade LGBTQIA+ à luta econômica, negando sua especificidade e autonomia. Essas posições não reconhecem que a opressão e a exploração, embora entrelaçadas, não são a mesma coisa e que superá-las requer uma intervenção específica e consciente a partir de uma perspectiva anticapitalista.
Teorias Pequeno-burguesas
Embora tenham surgido como resposta ao abandono dessas lutas por parte do marxismo degenerado, várias correntes feministas pequeno-burguesas apresentam limitações significativas:
● Políticas de identidade: Surgem para visibilizar as opressões específicas dos grupos marginalizados, mas, em última instância, fragmentam a luta, abandonando uma estratégia de classe coletiva e unificada. Ao priorizar política e organizativamente as diferenças de raça, gênero, orientação sexual ou condição migratória, conduzem ao divisionismo e, portanto, enfraquecem as lutas. Assim como as feministas radicais, esses setores são abertamente antirrevolucionários de esquerda.
● Feminismo da diferença: Enraizado no idealismo, reduz a opressão a níveis simbólicos e ontológicos, abandonando a análise materialista. Em alguns casos, leva a posições reacionárias, como a rejeição às mulheres trans (TERF/FART).
● Feminismo Radical (Radfem): Embora reconheça o patriarcado como um sistema autônomo ou paralelo ao capitalismo, muitas de suas correntes caem no separatismo ou na identificação do homem como inimigo, ignorando a mediação de classe. Algumas versões atuais tentam superar o separatismo incorporando críticas ao capitalismo a partir de perspectivas de reprodução social. Caracteriza-se por ser antipartidária e principalmente antirrevolucionária.
● Pós-estruturalismo: Influenciado pelo pensamento de Foucault e Butler, argumenta que o gênero e a sexualidade são construções sociais. Propõe a “desconstrução” das narrativas dominantes, mas limita sua ação ao âmbito cultural, sem oferecer um horizonte revolucionário.
● Feminismo Interseccional: Hegemônico em muitos países, coloca a inter-relação de diferentes opressões (raça, classe, gênero). No entanto, em particular em sua versão acadêmica, dilui a questão de classe. Mas, em geral, minimiza a contradição social fundamental entre capital e trabalho ao ver a exploração capitalista como uma forma a mais de opressão entre muitas outras. Isso não foi reformulado em essência por autoras como Bell Hooks e Angela Davis, apesar de que tenham tentado aportar certa dimensão material.
● Feminismo do 99%: Busca sintetizar diversas correntes (socialista, interseccional, feminismo identitário etc.) sob uma crítica ao capitalismo como sistema social. Embora se defina como anticapitalista, carece de uma estratégia definida e de um programa de transição, o que o torna vulnerável a desvios reformistas.
● Feminismo abolicionista: Emergente principalmente nos Estados Unidos, realiza valiosas contribuições ao expor o papel da polícia, das prisões e do Estado na sustentação do patriarcado, do racismo e do capitalismo. Sua ênfase na abolição conecta-se diretamente com as lutas contra a violência estatal e o encarceramento em massa, que afetam especialmente as mulheres negras, migrantes e da classe trabalhadora, bem como as pessoas LGBTQIA+. No entanto, tende a permanecer dentro de um horizonte anarquista, rejeitando a necessidade de um partido revolucionário e uma estratégia clara para derrubar o capitalismo. Seu falso método o leva a pedir a abolição das instituições (como as prisões ou o aparato repressivo do Estado burguês), sem questionar as relações capitalistas de produção, que necessariamente geram tais instituições, o que conduz ao utopismo, em vez do socialismo científico. Assim como o Feminismo para os 99%, muitas vezes resulta impreciso em relação a como construir a consciência de classe, limitando seu potencial a uma crítica moral da opressão em vez de um programa de transformação revolucionária.
O papel do stalinismo na luta das mulheres e das dissidências de gênero
A Revolução Bolchevique de 1917 inaugurou um período sem precedentes de conquistas para as mulheres e as pessoas LGBTQIA+: aborto legal, divórcio gratuito, igualdade civil, descriminalização da homossexualidade, criação do Zhenotdel (um departamento para mulheres) e a socialização parcial das tarefas domésticas. Essas transformações foram possíveis porque, desde suas origens, o feminismo marxista revolucionário uniu de forma inequívoca a luta de classes com as reivindicações das mulheres e de todos os setores oprimidos, rompendo com o feminismo burguês e lutando dentro do partido revolucionário para enfrentar o patriarcado desde suas raízes materiais. Lenin expressou isso com clareza: “É absolutamente necessário criar um poderoso movimento internacional de mulheres, fundado em uma base teórica clara e precisa”.
Embora as condições materiais na União Soviética inicial dificultassem a socialização do trabalho doméstico, a burocracia stalinista levou a cabo uma verdadeira contrarrevolução em termos de gênero. Dissolveu o Zhenotdel, criminalizou a homossexualidade, penalizou o aborto e reinstaurou a figura da “mãe heroica” como ideal feminino. Como descreveu Trotsky, a burocracia “começou a cantar hinos ao jantar em família e à lavagem de roupa familiar, isto é, à escravidão doméstica das mulheres”. Essa política anulou conquistas fundamentais e reinstaurou a opressão patriarcal, enfraquecendo o vínculo entre a classe trabalhadora e os setores oprimidos e impulsionando o desenvolvimento de teorias feministas separatistas e pequeno-burguesas.
A experiência anterior, com figuras como Clara Zetkin e Rosa Luxemburg, havia mostrado o caminho oposto: organizar as mulheres trabalhadoras dentro do movimento operário, em uma luta comum contra o capitalismo. Zetkin diferenciou claramente o Frauenbewegung (movimento burguês interclassista) do Arbeiterinnenbewegung (movimento de mulheres trabalhadoras), argumentando que “não é o trabalho das mulheres em si que reduz os salários, mas a exploração desse trabalho por parte dos capitalistas que se apropriam dele”. O stalinismo, ao romper a união virtuosa entre a luta de classes e a luta contra a opressão de gênero, provocou um retrocesso histórico que condicionou o desenvolvimento do movimento feminista durante décadas, tanto na URSS quanto em nível internacional. No entanto, mesmo no pós-guerra, marxistas revolucionárias como Evelyn Reed e Clara Fraser retomaram essa tradição, defendendo a articulação inseparável entre a luta contra todas as opressões e a luta anticapitalista.
A lição é clara: a verdadeira emancipação das mulheres e da comunidade LGBTQIA+ só é possível no marco da luta revolucionária contra o capitalismo e requer uma ruptura total com as distorções, os métodos e as políticas misóginas do stalinismo. Somente o feminismo marxista revolucionário, tal como desenvolvido pelo trotskismo, oferece um programa capaz de confrontar simultaneamente o patriarcado e a exploração de classe para avançar rumo à única sociedade onde podemos ser livres: o comunismo.
Rumo a uma Estratégia Revolucionária, Internacionalista e Comunista
Superar a opressão de gênero e sexual requer uma estratégia socialista, revolucionária e anticapitalista que reconheça a especificidade dessas lutas, as integre com a luta de classes e as oriente para a transformação estrutural da sociedade. As lutas das mulheres e das pessoas LGBTQIA+ não são secundárias; são indispensáveis para a revolução socialista.
Isso implica lutar simultaneamente contra o sistema capitalista, o patriarcado, o racismo, o colonialismo, a heteronormatividade e todas as formas de opressão estrutural, com uma perspectiva que vincule as demandas imediatas a um programa de transição para uma sociedade livre de exploração e dominação.
Essa luta se sintetiza e organiza através da construção do partido revolucionário e da internacional, que são o único meio para alcançar e defender esses direitos. Este é o eixo central do feminismo revolucionário e da comunidade LGBTQIA+, sem o qual todo o resto é limitado e abstrato. As correntes reformistas ou pequeno-burguesas estão destinadas ao fracasso ou a trair o movimento feminista e LGBTQIA+. Não é possível derrotar o patriarcado sem derrotar o sistema capitalista. E, ao mesmo tempo, não é possível destruir este sistema de opressão, violência e exploração sem um partido organizado nacional e internacionalmente sob um programa e uma teoria revolucionários e socialistas.
Este é um debate fundamental que mantemos com grande parte do movimento feminista e LGBTQIA+, e devemos assumi-lo com toda a nossa força militante para incorporar às fileiras do partido e da revolução os melhores elementos da vanguarda que se mobilizam e atuam nesses fronts. Nos partidos revolucionários, as organizações debatem e definem políticas e diretrizes para intervir na realidade. Também se estabelecem comitês ou comissões para trocar opiniões, contribuir e enriquecer as políticas aprovadas pelas organizações.
O patriarcado sexista e LGBTQIA+ódio deve ser destruído. Com o socialismo, essa tarefa histórica começará, mas sua derrota total só será possível com a superação completa das relações de opressão, ou seja, com o comunismo. Por isso, mesmo após a tomada do poder pela classe trabalhadora e a instauração do socialismo, continuaremos travando uma batalha decidida contra o patriarcado. Nossa política e programa feministas devem estar presentes em todo o processo socialista revolucionário.
Uma tarefa constante dentro de nossos partidos e da Internacional
Não poderemos alcançar uma sociedade onde todos os seres humanos sejam iguais sem mostrar a determinação de superar a desigualdade sexual dentro de nossos próprios movimentos. Apoiamo o direito das mulheres, dentro do movimento operário e dos sindicatos, de se reunirem de forma independente para identificar e combater a discriminação, assim como seu direito a uma representação proporcional nas estruturas de liderança. Também apoiamos o direito de estabelecer comissões ou frentes de ação dentro dos partidos revolucionários, no marco do funcionamento do centralismo democrático.
A diferença entre uma perspectiva stalinista ou maoísta e uma perspectiva trotskista-bolchevique sobre a intervenção entre as mulheres e as pessoas particularmente oprimidas reside no fato de que, para esta última, essa intervenção é tarefa de todo o partido, mas também requer ferramentas específicas, assim como a opressão de gênero. O stalinismo abandonou esses instrumentos. A luta contra o patriarcado, o cisheterossexismo e o capitalismo deve ser coordenada dentro de uma estratégia revolucionária com o objetivo de derrubar a ordem social atual e construir o socialismo.
Por isso é necessário criar comissões especiais — a nível local, nacional e internacional — para intervir nos movimentos de mulheres e de pessoas oprimidas por motivos de gênero, sexualidade, racialização ou deficiência. Isso não é feminismo liberal nem identitarismo, mas uma política revolucionária concreta que assume que a emancipação das mulheres e das pessoas particularmente oprimidas não é uma consequência do comunismo, mas uma ferramenta essencial para sua construção.
Nosso Programa
Contra a exploração, pela igualdade salarial e de direitos! Em todo o mundo, as mulheres recebem menos que os homens pelo mesmo trabalho ou são obrigadas a aceitar empregos mais precários e mal remunerados, aumentando sua dependência econômica de suas famílias e parceiros. As pessoas LGBTQIA+ enfrentam formas similares de exclusão e marginalização no mercado de trabalho. A verdadeira emancipação não pode vir de medidas sociais que reforcem a dependência e a subordinação, mas sim da independência econômica, do acesso a um trabalho decente e da recuperação dos direitos trabalhistas. Por isso, lutamos pela igualdade de direitos onde quer que sejam negados e pela igualdade de condições laborais para todas e todos. A luta contra a opressão de gênero deve ser inseparável da luta de classes, enfrentando a fragmentação imposta pelo capital e suas burocracias sindicais. Somente assumindo o controle de nossas próprias condições de vida e trabalho, a classe trabalhadora pode abrir o caminho para uma transformação socialista da sociedade.
Exigimos:
● Não somos menos! Igualdade de direitos e remuneração para mulheres e pessoas LGBTQIA+. Revogação de todas as contrarreformas que reduziram direitos.
● Trabalhar menos, trabalhar todos. Redução da jornada de trabalho sem cortes salariais, para criar mais empregos e redistribuir a força de trabalho.
● Acabar com a dependência econômica e a pobreza na velhice. Uma renda mínima nacional, ajustada automaticamente à inflação, garantida para todos e administrada sob o controle das organizações de trabalhadores.
● Abolir o trabalho forçado e o trabalho precário. Acabar com a escravidão, o trabalho informal e a exploração por meio de programas de obras públicas que forneçam empregos em tempo integral com salários dignos.
● Proteção total para os pais. Proteção para trabalhadoras grávidas, isenção de trabalho fisicamente exigente, garantia de estabilidade laboral ao retornar e licença-paternidade igualitária para assegurar a responsabilidade compartilhada no cuidado infantil.
● Tolerância zero ao abuso no local de trabalho. Acabar com assédio, chantagem e violência sexual no trabalho por meio de comitês autogeridos e dirigidos pelos trabalhadores. Os sindicatos devem liderar amplas campanhas em escolas, universidades e locais de trabalho sobre consentimento e contra o sexismo.
● Socialização do trabalho reprodutivo, de cuidados e de criação de crianças. Significa que todas as tarefas reprodutivas, como criação de filhos, cuidado de familiares doentes, cozinha ou tarefas do lar, sejam organizadas por toda a sociedade e deixem de ser relegadas ao âmbito privado (família), onde as mulheres frequentemente assumem trabalho extra.
● Acabar com a dupla jornada das mulheres por meio da socialização do trabalho doméstico: por cuidado infantil gratuito 24 horas e uma expansão massiva de restaurantes públicos, cozinhas comunitárias, restaurantes e lavanderias baratos e de qualidade, sob controle operário!
Basta de todas as formas de machismo e violência LGBTQIA+odiante
A violência contra mulheres e pessoas LGBTQIA+ não é uma exceção, mas uma expressão estrutural do sistema capitalista patriarcal, que se manifesta de múltiplas formas. Os feminicídios, travesticídios, a violência sexual, doméstica e institucional deriva da lógica de propriedade e dominação enraizada na sociedade capitalista, onde as relações são moldadas pelo poder, controle e mercantilização.
As estatísticas de assassinatos, estupros e assédio são esmagadoras e normalizadas, assim como as mortes no local de trabalho. Ambos são sintomas de uma ordem social que trata como descartáveis aquelas vidas que não se encaixam em sua lógica de produção e reprodução. Tanto as democracias liberais quanto os regimes autoritários e religiões reacionárias sustentam esse sistema de dominação, atacando sistematicamente os direitos sexuais e reprodutivos, ao mesmo tempo que reforçam narrativas que perpetuam a violência e a exclusão. Os travesticídios, terapias de conversão, assédio em escolas e locais de trabalho, e a repressão estatal e religiosa refletem a mesma matriz de opressão patriarcal, LGBTQIA+odiante e capitalista.
Exigimos:
• Orçamento público para enfrentar a emergência da violência de gênero, sem cortes nos serviços sociais.
• Financiamento de centros de atendimento à violência e abrigos para mulheres maltratadas, sob controle independente das próprias mulheres, e não de entidades religiosas. Garantir financiamento para a reintegração social e laboral das sobreviventes.
• Não a leis que obrigam ou proíbem mulheres de usar vestimenta religiosa. As mulheres devem ter o direito legal de se vestir como escolherem. Abolir todas as leis anti-LGBTQIA+ e garantir a autodeterminação de gênero.
O assédio e a violência sexual ainda influenciam nosso cotidiano. Apesar do mito de que “estranhos são o perigo”, a maior parte da violência é cometida por homens conhecidos das vítimas. As mulheres ainda são tratadas como propriedade dentro da família nuclear, que é o pilar ideológico do capitalismo, e pessoas LGBTQIA+ enfrentam violência física, sexual, simbólica e econômica tanto dentro das famílias quanto na sociedade.
Exigimos:
• Acabar com a autoridade parental absoluta, o casamento infantil, o dote e todas as práticas legais patriarcais.
• Pontos de contato integrados para denunciar violência sexual e apoio psicológico gratuito e imediato mediante solicitação.
• Acabar com a obstrução das denúncias: em vez de comissões policiais, as investigações devem ser supervisionadas por comitês sindicais e representantes das sobreviventes, com pleno acesso aos recursos policiais. Proibir interrogatórios que culpabilizem as vítimas por sua vestimenta ou comportamento.
• Assistência jurídica gratuita e cobertura dos custos legais para as vítimas, assim como apoio social de longo prazo, financiado pelo Estado. Licenças remuneradas e renda mínima indexada à inflação para sobreviventes.
• Retirada imediata dos homens violentos do lar. Assistência jurídica gratuita e caminhos protegidos para que as vítimas escapem da violência. Ampliação de programas de reabilitação para agressores.
A brutal realidade da prostituição, do tráfico e da indústria pornográfica expõe a lógica destrutiva do capitalismo. Por um lado, cada vez mais mulheres são obrigadas a sobreviver através do trabalho sexual; por outro, as relações humanas se mercantilizam, gerando imagens distorcidas e exploradoras. Isso não significa criminalizar o trabalho sexual. Lutamos pelos direitos das trabalhadoras, por caminhos de saída social e por um mundo onde a sexualidade seja verdadeiramente livre.
Exigimos:
• Proibir o proxenetismo e o tráfico de pessoas; confiscar bens e lucros, e que as trabalhadoras sexuais tenham controle sobre suas condições de trabalho.
• Exames médicos e anticoncepcionais gratuitos. Programas financiados para a saída voluntária da prostituição por meio de educação, formação e empregos socialmente úteis, financiados com lucros corporativos.
• Sindicalização das trabalhadoras sexuais.
• Controle e direito de veto das trabalhadoras sobre pornografia discriminatória e publicidade sexista.
As reformas legais e a mudança cultural não são suficientes. Devemos desmantelar a família patriarcal e heteronormativa como pedra angular ideológica do sistema, socializar o trabalho de cuidados e assegurar verdadeira autodeterminação sobre nossos corpos e desejos. Apenas uma revolução socialista — que abolisse a propriedade privada e planejasse a economia para as necessidades humanas, não para o lucro — pode criar uma sociedade livre de opressão de gênero e sexual.
Exigimos:
• Organizações autogeridas pelas trabalhadoras para combater a violência laboral.
• Um caminho garantido para as sobreviventes da violência hetero-cis-patriarcal, rejeitando a denúncia obrigatória.
• Acabar com os feminicídios mediante auto-organização proletária e antipatriarcal.
• Educação integral sobre gênero, sexualidade, consentimento e direitos das pessoas com deficiência, organizada por sindicatos e organizações de mulheres em escolas, universidades e centros de trabalho.
Contra toda violência de gênero e LGBTQIA+ em situações de guerra, migração e crise climática. Por um feminismo socialista, antiimperialista, antirracista e anticolonial
As guerras imperialistas devastam populações em benefício do capital global. Mulheres e pessoas LGBTQIA+ são alvos de violência sexual, deslocamento forçado e repressão militarizada. As economias de guerra normalizam a violência de gênero, destroem a vida social e reforçam o autoritarismo. De Gaza à Ucrânia, do Sudão ao Iêmen, os Estados capitalistas e as indústrias bélicas lucram com o derramamento de sangue. O militarismo patriarcal silencia a diversidade e mobiliza a masculinidade como ferramenta de controle.
Nossa organização se opõe a qualquer tentativa de dividir a classe trabalhadora por meio de políticas fronteiriças racistas, nacionalismo cultural ou segmentação laboral. As trabalhadoras migrantes devem ser agentes ativos na construção de políticas revolucionárias.
As mulheres indígenas, camponesas e trabalhadoras se organizam contra a mineração, o desmatamento e a privatização da água. Seu conhecimento ecológico e capacidade organizativa são indispensáveis.
A exploração e opressão capitalista de mulheres e pessoas LGBTQIA+ se intensifica quando sofrem também opressão racista e colonial. Mulheres negras, indígenas, racializadas e de países colonizados ou semicolonizados enfrentam múltiplas opressões que as colocam em situações de hiperexploração e violências articuladas pelo capital, patriarcado, racismo e colonialismo.
Exigimos:
● Apoio à resistência antimilitarista, feminista e da classe trabalhadora em zonas de guerra. Por comitês de autodefesa da população organizados democraticamente, que também tenham acesso a armas e gerenciem democraticamente os suprimentos de ajuda humanitária!
● Não às guerras, sanções e bloqueios imperialistas! Abaixo todas as ocupações imperialistas, como a da Rússia na Ucrânia e anteriormente na Chechênia, as ocupações das potências da OTAN no Afeganistão e Iraque, a ocupação israelense da Palestina, do Marrocos no Saara Ocidental e o bloqueio estadunidense a Cuba, Irã, Coreia do Norte e Venezuela! Apoiamo-nos à resistência contra todas essas ocupações e bloqueios.
● Não pagamento das dívidas públicas com os organismos financeiros e o banco internacional.
● Não ao sionismo, não à lavagem de imagem genocida sionista e a qualquer outra intervenção imperialista na reivindicação da democracia, dos direitos das mulheres e dos direitos LGBTQIA+.
● Redirecionar os orçamentos militares para infraestrutura sanitária, recuperação ecológica e investimento em educação, habitação e saúde para comunidades racializadas.
● Conceder asilo e cidadania, abrir todas as fronteiras, abolir todos os controles: livre circulação para quem busca trabalho ou asilo, garantindo plena cidadania, bem-estar social, habitação e direitos laborais a todos aqueles que fogem de ditaduras, guerras brutais, opressão por motivos de raça, sexo ou identidade de gênero e pobreza em seus países de origem.
● Abolir todos os controles que impedem a livre circulação de pessoas que buscam trabalho e conceder plena cidadania, bem-estar social, habitação e direitos laborais.
● Plenos direitos de trabalhar, se organizar e acessar serviços, independentemente do status legal.
● Caminhos para a cidadania sem assimilação cultural ou condições econômicas.
● Organização conjunta transfronteiriça entre trabalhadores migrantes e locais.
● Proteção laboral universal para trabalhadores migrantes, incluindo direitos sindicais.
● Inclusão de migrantes em políticas sociais, tomada de decisões e programas de habitação.
● Serviços públicos multilíngues projetados para atender às necessidades dos migrantes.
● Uma transição ecológica justa liderada pelas comunidades mais vulneráveis. Proteção da governança ecológica indígena.
● Nacionalização das indústrias extrativas e de combustíveis fósseis sob controle operário.
● Produção ecosocialista centrada nas necessidades comunitárias, não no lucro.
● Reparações pela escravidão, colonialismo e racismo estrutural. Redistribuição da riqueza expropriada durante o colonialismo.
● Abolição das forças policiais e das instituições penitenciárias racistas. Estabelecimento de uma milícia operária sob o controle direto de um conselho de trabalhadores.
● Educação política antirracista integrada em todos os níveis do movimento socialista.
● Autodeterminação das nações colonizadas e dos povos indígenas.
Contra os ataques reacionários e conservadores da extrema direita:
A extrema direita e os fascistas têm uma política sistemática de atacar os direitos democráticos conquistados, com discursos e políticas conservadoras e reacionárias, mirando os direitos das mulheres e das pessoas LGBTQIA+. Por isso, nesta etapa, nosso programa deve incluir slogans que respondam a esses ataques e expressem nossa política para enfrentar e derrotar esta ofensiva reacionária.
Exigimos:
● Plenos direitos para pessoas LGBTQIA+, incluindo o direito à união civil e ao casamento.
● O direito das pessoas LGBTQIA+ de criar filhos.
● A abolição de todas as leis que patologizam pessoas LGBTQIA+ e o estabelecimento de vias protegidas, livres e garantidas para a autodeterminação.
● Não à proibição de educar as pessoas sobre sua orientação sexual. Não à interferência na vida sexual de adultos que consentem. Pela livre expressão de todas as formas de sexualidade e relacionamentos.
● A abolição da mutilação genital feminina e das práticas de violência patriarcal contra o corpo das mulheres.
Pelo direito de decidir sobre nossos corpos e vidas. Por políticas integrais de saúde pública:
A imposição da maternidade obrigatória está diretamente vinculada à manutenção da propriedade privada, convertendo pessoas com útero em instrumentos de reprodução e sobrecarregando-as com trabalho de cuidados invisível e não remunerado que sustenta o sistema capitalista. Defendemos o aborto como uma questão de saúde pública, justiça reprodutiva e direitos humanos.
A criminalização do aborto é uma forma de violência que afeta principalmente mulheres trabalhadoras, negras, indígenas, migrantes e pobres, privando-as da autonomia sobre suas vidas. Também lutamos para que a legalização do aborto não beneficie a burguesia, que lucra com a privatização da saúde, mas seja um direito universal, garantido por um sistema público acessível a todas as pessoas.
Exigimos:
● Aborto legal, seguro, gratuito, voluntário e no sistema público de saúde.
● Saúde sexual e reprodutiva universal, com perspectiva de gênero e diversidade sexual.
● Parto humanizado. Luta contra a violência obstétrica e misógina na atenção médica das mulheres.
● Anticoncepção gratuita, acessível e garantida.
● Apoio efetivo à maternidade mediante a socialização das tarefas de cuidado e a provisão de instalações adequadas para apoiar as mães.
● Abolição de todas as leis que dificultam a decisão de mulheres e pessoas LGBTQIA+ sobre seus corpos.
● A expulsão de instituições e práticas religiosas dos centros de saúde e hospitais, e o fim de toda interferência religiosa na atenção médica.
● Políticas públicas para atender às demandas de mulheres e pessoas dissidentes na velhice.
Estados separados de toda base religiosa:
As instituições e a legislação do Estado burguês buscam garantir a exploração e a opressão patriarcal, com características misóginas, homofóbicas e transfóbicas. A Igreja Católica, assim como outras, mantém relação direta com o Estado, sendo seu principal financiador. As igrejas têm poder para atuar dentro do Estado, exercendo opressão patriarcal sobre mulheres e comunidade LGBTQIA+.
Exigimos:
● A abolição de todo financiamento estatal a organizações religiosas, em quaisquer de suas formas.
● Por uma verdadeira Educação Sexual Integral, científica e sem interferência clerical.
● Não à violência do fundamentalismo reacionário e religioso: abolição do véu e de todas as leis segregacionistas em países teocráticos, liberdade de escolha para as mulheres.
● Abolição dos códigos civis e familiares divididos segundo a identidade religiosa. Por um código laico único em todos os países.
● Igualdade de direitos para famílias do mesmo sexo, pleno reconhecimento dos direitos das crianças e das famílias para todos, direito à adoção para famílias do mesmo sexo.
Sindicatos
Os sindicatos são uma das expressões mais importantes do movimento operário, mas frequentemente não estão estruturados democraticamente. Especialmente nos países imperialistas, devemos lutar contra a burocracia sindical, que com frequência promove políticas de colaboração de classes. Ao fazê-lo, reproduz o racismo, o sexismo e outras divisões dentro da nossa classe. Por isso, sempre que possível, lutamos pela sua democratização, incluindo a eleição e revogabilidade dos cargos a qualquer momento, e a responsabilidade direta dos líderes de greve perante os próprios grevistas.
Exigimos:
● Pelo direito a reuniões e estruturas separadas para grupos socialmente oprimidos (mulheres, jovens, migrantes, gays, lésbicas, pessoas trans e não binárias, e pessoas com problemas de saúde mental), sem qualquer paternalismo por parte do aparato. Pela luta ativa para organizar esses grupos e contra toda discriminação racista, sexista ou homofóbica!
● Pelo direito dos membros de um setor específico de se organizarem em estruturas especializadas. Isso inclui organizar campanhas em setores com baixa filiação sindical (como trabalhadores precários, empregados de serviços e de alta tecnologia, e mulheres). Também implica organizar ativamente pessoas desempregadas e oprimidas com pleno direito de filiação aos sindicatos.
Pela revolução socialista mundial:
O feminismo marxista revolucionário e os movimentos LGBTQIA+ atuam entre mulheres e pessoas LGBTQIA+, vinculando sua libertação à derrubada da sociedade burguesa, em todos os países e em escala global. Somente a derrubada da sociedade burguesa pode liberar mulheres e pessoas LGBTQIA+, particularmente oprimidas pela exploração capitalista, pela opressão do trabalho familiar e das tarefas de cuidado (socialização do trabalho doméstico), e pelos mil legados da tradição patriarcal. Daí seu principal referente social: a classe trabalhadora em geral, os povos oprimidos pelo imperialismo e, em particular, o proletariado feminino e a massa de mulheres oprimidas, tanto em países imperialistas quanto dependentes.
Nosso objetivo estratégico é um mundo sem exploração, sem opressão e sem fronteiras nacionais: um mundo comunista. Lutamos pelo governo da classe trabalhadora. Lutamos por construir uma organização internacional que seja a ferramenta para derrotar o capitalismo e construir uma sociedade socialista, feminista e diversa. Nosso horizonte é um movimento multiétnico e internacionalista de mulheres trabalhadoras e LGBTQIA+, enraizado na unidade com as lutas mais amplas da classe trabalhadora como um todo. Nossa libertação será alcançada juntos, como parte da emancipação coletiva da humanidade.
Viva a revolução socialista feminista e LGBTQIA+!
Viva o internacionalismo proletário!
Viva a revolução socialista internacional!
Aprovado pelo III Congresso Mundial da LIS




