Por Gustavo Garcia
Na última segunda-feira, 31 de março, foi notícia a condenação por desvio de fundos públicos de Marine Le Pen, a líder política do partido de extrema-direita francês Agrupamento Nacional (Rassemblement National). Acusada de criar cargos com fundos da União Europeia para garantir salários ao seu círculo familiar, financiar despesas pessoais e de seu partido. Le Pen foi condenada a 4 anos de prisão, dos quais dois poderia cumprir em prisão domiciliar e dois em suspensão, além de uma proibição para concorrer às eleições e ocupar cargos públicos por cinco anos.
O peixe morre pela boca
Se alguém tentava se definir como “anti-sistema” na França, nestes últimos anos de crise capitalista e de raiva contra aqueles que governavam, era Marine Le Pen. Seu discurso de ódio, proto-fascista, foi acompanhado por uma “luta feroz” contra os privilégios da casta política que governou e governa, chegando ao limite de declarar abertamente em 2013 que quem for acusado pela acusação da qual ela foi condenada deveria ser inelegível «para o resto da vida».
Embora seja acusada de vários crimes, o escândalo surge principalmente porque criou cargos de assistentes, durante seu mandato como deputada ao parlamento europeu no período 2004 a 2017, para seu ex-marido, seu cunhado e até o empregado de seu falecido pai, o fascista Jean-Marie Le Pen. Pessoas que, além disso, nunca trabalharam para tais empregos.
Toda a solidariedade com… Le Pen?!
Este acontecimento com alto teor de hipocrisia, embora tenha causado uma indignação lógica em amplas camadas populares e alegria pela condenação em tantas outras, não levou a um recuo do Agrupamento Nacional; pelo contrário, eles atualmente estão fazendo uma campanha contra os juízes que condenaram sua principal liderança política, «contra as instituições e o sistema». A partir de sua campanha argumentam que a democracia está em perigo, uma vez que atenta contra a liberdade de participação nas eleições como candidata. Não nos surpreende: Marine Le Pen é a principal figura da extrema direita, participou da última votação contra o atual presidente Emmanuel Macron e é uma candidata forte para as próximas eleições presidenciais de 2027. Não quer ficar de fora tão facilmente. Por isso eles estão em mobilização permanente, ao ponto que se mobilizaram no domingo, 6 de abril, pela segunda vez em uma semana. Jogadas políticas que os meios de comunicação qualificam como semelhantes às do trumpismo.
Mas, infelizmente, ela não apenas teve uma intensa campanha de solidariedade por parte de seus amigos do mesmo espaço, mas todo o arco político até a esquerda de Mélenchon hesitou e até mesmo expressou sua preocupação com a condenação. É assim como o dirigente de A França Insubmisa (La France Insoumise – LFI), Jean-Luc Mélenchon disse que “a decisão de destituir um cargo eleito deveria ser do povo”, explicando que “A França Insubmissa nunca teve como forma de atuar o uso dos tribunais para se livrar do Agrupamento Nacional. Estamos combatendo nas urnas e nas ruas, através da mobilização do povo francês”. Posição desconcertante.
Mas acontece que o Libération, há alguns dias, informou que Jean-Luc Mélenchon estava no centro de uma investigação judicial aberta em 2018. Um relatório do Organismo Europeu de Luta Antifraude concluiu que houve “irregularidades” no valor de 500.000 euros. No entanto, nem o líder de La France Insoumise (LFI) nem qualquer outra pessoa foi acusada neste processo, cujo resultado não é inevitavelmente um julgamento.
Não só politicamente está tentando se proteger de uma eventual investigação, julgamento e condenação, mas também nessa tentativa fica preso a personagens da extrema direita como Éric Zemmour, de Reconquista, que defendeu o direito de Le Pen a concorrer às eleições explicando também que «não cabe aos juízes decidir por quem o povo deve votar».
Uma política revolucionária contra os privilégios
Em seu editorial, o NPA Révolutionnaires[1] expressou com justa clareza a necessidade de exigir a aplicação imediata da pena. Le Pen não deve concorrer às eleições, embora muitos enchem a boca denunciando que “a democracia está em perigo”. Porque finalmente se lembram da democracia quando lhes convém, sustentam esta democracia enquanto garantir seus lucros e conter a raiva dos trabalhadores, mas assim que se torna inevitável encobrir sua corrupção e isso se volta contra eles, tentam por todos os meios escapar dela. Nunca vimos nenhum desses personagens “preocupados” frente à repressão de protestos sociais ou ao corte orçamentário em saúde e educação, por acaso isso também não seria defender a democracia? Hipócritas!
Para acabar com a corrupção acreditamos que é necessário avançar em direção a outro modelo: fazer política não pode ser um caminho para o enriquecimento individual. Por isso os políticos devem ganhar como uma diretora de uma instituição de ensino; se decidem sobre o que é público, têm que usar o que é público por lei; basta de serem atendidos em clínicas privadas e enviar seus filhos para escolas particulares e a revogação de seu mandato como eixo fundamental.
Vencer a extrema direita, pela mão da justiça corrupta?
Por fim, sabemos que vencer a extrema direita é mais complexo do que uma pena através desta justiça que deixa livres os violentos, persegue imigrantes e condena trabalhadores que exercem seu direito de se sindicalizar ou protestar. O caráter de classe desta justiça só mudará quando as e os trabalhadores, nossa classe, pela via do poder político, transformarmos este sistema e com ele todas as instituições. Mas para essa tarefa, a organização é chave. Vamos construí-la nas ruas, em nossos locais de trabalho, nas faculdades. Porque o mundo deve ser governado por quem o faz funcionar.
[1] https://npa-revolutionnaires.org/marine-le-pen-se-prend-la-prison-ferme-quelle-reclame-pour-dautres/