Por: Correspondente
O Encontro, que reuniu cerca de trinta organizações de diferentes países, foi realizado em Paris, entre os dias 16 e 18 de maio. A Liga Internacional Socialista (LIS) e o espaço afim ao reagrupamento internacional dos revolucionários que impulsionamos participaram ativamente, contribuindo com suas opiniões e propostas.
De Milão a Paris
A convocatória para o Encontro de Paris teve como eixo “…aprofundar o debate sem ocultar desacordos ou diferentes avaliações da realidade e disponibilizando a todas as companheiras e companheiros uma ampla gama de posições”. Nesse sentido, o Comitê Promotor publicou, como tem feito em cada encontro, o Internationalist Correspondence Bulletin, com todas as contribuições escritas enviadas.
Posteriormente, na sede parisiense do NPA-R, desenvolveu-se o intercâmbio oral de opiniões, cuja pauta concentrou-se na situação internacional — primeiro e segundo dias — e nas experiências militantes na classe trabalhadora — terceiro dia. As intervenções e réplicas evidenciaram os acordos e diferenças políticas sobre os temas centrais que detalhamos a seguir.
O debate permitiu constatar a existência de três blocos de opiniões mais ou menos convergentes. a) O mais homogêneo foi composto pelos integrantes da LIS, junto aos companheiros da OTI, da L5I, do MAS de Portugal e da Alternativa Socialista da Austrália; b) um segundo bloco com posições similares às de Lotta Comunista da Itália; c) e um terceiro, mais heterogêneo, tendo o NPA (R) como referência.
As transformações impulsionadas por Donald Trump
Partindo do reconhecimento de que Trump pretende impor mudanças na ordem mundial, expressaram-se nuances quanto às motivações que o impulsionam, aos alcances e às consequências nos EUA e no mundo.
Nós afirmamos que, após a queda da URSS e do Muro de Berlim, o imperialismo estadunidense acreditou que a restauração capitalista permitiria consolidar e ampliar seu domínio. No entanto, a realidade não se desenvolveu conforme o esperado. Sem seu aliado contrarrevolucionário — o aparato stalinista —, os EUA tiveram que enfrentar sozinhos os embates da luta de classes. Não conseguiram semicolonizar China ou Rússia, que se transformaram em potências imperialistas e passaram a disputar a hegemonia mundial. Ainda que os EUA tenham mantido sua primazia, esta foi se enfraquecendo, com um salto a partir da crise de 2008, enquanto a China se consolidava como potência global, abrindo uma nova guerra fria.
Todas as medidas impulsionadas por Trump em seu segundo mandato têm como objetivo tentar recuperar o papel que os Estados Unidos vêm perdendo. Se terá êxito ou não, será definido pela luta de classes nos próprios EUA e em nível mundial. Por ora, mais do que uma nova ordem, vivenciamos uma grande desordem mundial, a intensificação das tensões interimperialistas e um futuro cada vez mais incerto, onde apenas a revolução socialista pode impedir o avanço da barbárie capitalista.
Nacionalidades oprimidas e autodeterminação: Ucrânia e Palestina
Repetiram-se as divergências já expressas no Encontro anterior a respeito das reivindicações das nacionalidades oprimidas e da autodeterminação, principalmente com Lotta Comunista, que as considera “questões do passado”. Também houve diferenças com outras organizações que sustentam posições ambíguas e equivocadas frente aos dois processos mais importantes em curso no Leste Europeu e no Oriente Médio.
A guerra na Ucrânia possui caráter dual: intervêm nela tanto o direito à autodeterminação ucraniana quanto as disputas interimperialistas. Por isso, desde a LIS e a Liga Socialista Ucraniana (LSU), apoiamos a resistência do povo ucraniano contra a invasão do imperialismo russo, ao mesmo tempo em que denunciamos a OTAN e o imperialismo ocidental com uma política independente de Zelensky. Atualmente, rechaçamos as negociações entre Trump e Putin feitas pelas costas do povo ucraniano, pois trarão consigo o saque de recursos estratégicos, a perda territorial e o rebaixamento do país à condição de submetido.
Com relação à Faixa de Gaza, impulsionamos a mais ampla unidade contra o genocídio, a limpeza étnica e a ocupação territorial promovidos pelo sionismo contra o povo palestino — mantendo independência em relação à política do Hamas, da qual nos separam importantes diferenças. Rejeitamos o engodo da utópica política dos dois Estados e sustentamos que a única saída passa por derrotar o Estado de Israel e conquistar uma Palestina única, laica, antirracista, democrática e socialista, objetivo que só pode ser alcançado promovendo a Revolução Socialista em todo o Oriente Médio.
Novos imperialismos: China e Rússia
Ainda existem organizações que opinam que China e Rússia são estados operários que devem ser defendidos. Trata-se de um verdadeiro absurdo, que conduz ao campismo e à capitulação diante dos novos imperialismos em ascensão. Outras organizações, ainda que reconheçam a evidente restauração capitalista, recusam-se a caracterizá-las como potências imperialistas, o que na prática também significa capitular à sua disputa com os EUA. Na LIS, não temos dúvidas de que a China transformou-se na principal potência imperialista que desafia a hegemonia do velho imperialismo, e que a Rússia também seguiu esse caminho, buscando reconstituir sua antiga zona de influência — razão pela qual invadiu a Ucrânia.
Sobre as experiências concretas
Como contribuição à jornada de intercâmbio de experiências sindicais nos locais de trabalho, apresentamos intervenções escritas desde Argentina, Bielorrússia, Ucrânia e Quênia, além das enviadas pelos companheiros do PCL. Oralmente, todas as companheiras e companheiros que participam do processo de reagrupamento intervieram no debate. Alejandro Bodart abordou a atuação do MST na FIT-U, acompanhada com interesse pela vanguarda de diferentes latitudes. Expôs seus aspectos positivos, mas também suas grandes limitações, como se viu na multitudinária mobilização de 24 de março¹. Nossos companheiros do Líbano e do Paquistão participaram virtualmente, o que permitiu acessar relatos de primeira mão sobre a luta contra o sionismo e as consequências do conflito entre as duas potências nucleares do subcontinente indiano, respectivamente.
Debilidades, limitações e aspectos positivos
Nos dois Encontros anteriores, em Milão (2023–2024), expressaram-se diferenças políticas tão profundas que ficou evidente que dali não poderiam sair declarações ou campanhas comuns. No entanto, criaram a possibilidade de contato e intercâmbio entre organizações que sim, possuíam importantes coincidências. Foi o que aconteceu entre a Liga Internacional Socialista (LIS), a Oposição Trotskista Internacional (OTI) e a Liga pela 5 Internacional (L5I), iniciando um processo de aproximação que caminha para a unificação em uma mesma organização.
O Encontro na França voltou a demonstrar as enormes diferenças existentes, mas também os grandes avanços no processo de reagrupamento em torno da LIS.
A LIS, um projeto dinâmico que se fortalece
As forças que já integram a LIS e aquelas que são politicamente afins desempenharam um papel destacado no evento. Estiveram presentes companheiras e companheiros de quinze países, entre participantes diretos, contribuições escritas e vídeos enviados. O Encontro ocorreu uma semana antes da confirmação da entrada das organizações da OTI na LIS. Constatou-se o avanço das relações com a L5I e o MAS (Portugal), bem como a sintonia política existente com a Socialist Alternative (Austrália) e outras organizações que acompanham com interesse o desenvolvimento potencial da LIS.
Deixamos também nosso reconhecimento às companheiras e companheiros anfitriões do NPA-R, com quem mantemos uma relação fraternal de colaboração e intercâmbio.
¹ https://lis-isl.org/pt/2025/05/polemica-com-o-pts-duas-concepcoes-na-esquerda-frente-a-etapa-milei/